São Paulo, Sexta-feira, 07 de Maio de 1999
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CINEMA - "O GUARDIÃO DA FLORESTA"
Apelo à "qualidade" sufoca trabalho criativo

da Redação

Em linhas gerais, "O Guardião da Floresta" descreve a trajetória de um jovem francês que tem dois dons complementares, o primeiro, de atrair injustificadamente a ira dos outros; o segundo, de escapar ileso dos mais tétricos problemas (por exemplo, um incêndio no colégio onde estuda, do qual se safa por estar de castigo).
Essa capacidade o credencia a se tornar uma espécie de Forrest Gump em tom menor. Sem nunca compreender o que se passa em seu redor, colocando à frente de tudo seu amor por crianças e animais, o homem -o ogro, como é chamado- escapa da prisão por pedofilia (injusta, por sinal) para ser engajado como soldado, na Segunda Guerra Mundial.
Preso, quando o exército francês é derrotado pelos alemães, acaba se tomando de ódio pelos seus compatriotas (que haviam matado alguns pássaros para comer) e consegue angariar a simpatia dos alemães. Termina trabalhando em uma escola para formação de jovens soldados nazistas, onde enfrentará o final da guerra.
Este filme dirigido por um alemão, com produção francesa e falado em inglês consegue se safar com habilidade das armadilhas que esses filmes internacionais propõem. Sentimos ali, apesar de tudo, um filme alemão.
Mas um filme alemão de Volker Schlöndorff, isto é, em que o traço acadêmico impõe-se a tudo mais com desenvoltura. Existe ali um apelo à "qualidade" que sufoca qualquer chance de trabalho criativo, submetendo tudo à ditadura do narrado. É como se todo o tempo qualquer coisa precisasse vibrar para que a história transite da tela para o espírito do espectador, mas essa coisa qualquer nunca se manifesta.
É um traço que, já nos melhores tempos do "jovem cinema alemão", distinguia Schlöndorff, e o colocava abaixo da trinca principal do período (R.W. Fassbinder, Wim Wenders, Werner Herzog).
Com o passar do tempo, Fassbinder morreu, Herzog sumiu, Wenders oscila entre altos e baixos. Quanto a Schlöndorff, continua fiel a um cinema cujo interesse -se há- deve vir mais da história que conta do que do trabalho de filmagem. É um pouco como Fred Zinnemann no cinema americano clássico, em seus maus dias.
Por isso mesmo, a narrativa de "O Guardião", embora escorreita, priva-se de oferecer ao espectador qualquer poesia, qualquer encanto, como se tudo devesse obedecer a um plano predeterminado, que acaba por amortecer a relação do espectador com o filme.
Talvez seja injusto dizer que isso acontece durante o filme inteiro. Nos momentos em que nosso ogro contracena com o mal, Goering, "O Guardião" baixa um pouco a guarda e dá lugar a um sentimento pessoal de Schlöndorff, que é seu ódio menos pelos nazistas do que pela chaga que sua chegada ao poder (e decorrências) infringiram à Alemanha "sadia".
Nesses momentos, Schlöndorff consegue criar um jogo de contrastes que efetivamente impulsiona seu filme e o faz vibrar. Não são, infelizmente, muitos momentos.
(INÁCIO ARAUJO)


Avaliação:


Filme: O Guardião da Floresta Produção: França, 1996 Direção: Volker Schlöndorff Com: John Malkovich, Armin Mueller-Stahl, Marianne Sägebrecht e outros Quando: a partir de hoje, no Cinearte 2 e Lumière 1


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