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"Tenho a obrigação de dar ao público algo que seja valioso"
DA REPORTAGEM LOCAL
Foi sob a direção de Jirí
Kylián que a Nederlands Dans
Theater se firmou como uma
das melhores companhias de
dança do mundo. Renovador da
linguagem do balé, um dos melhores coreógrafos da atualidade, ele falou à Folha sobre sua
criação que a NDT 2 traz ao
país e seu método de criação.
Veja trechos.
(RC)
FOLHA - O programa de "27'52""
destaca o tempo exigido para a criação do espetáculo. É sempre assim?
JIRI KYLIÁN - É sempre assim,
embora muitos pensem que é
algo que se possa fazer em uma
semana. É por isso que o título
remete à duração da peça. Quis
deixar claro que uma peça dessas demanda muito tempo em
pesquisas, na criação de figurinos, de música. Mas só se vê 27
minutos e 52 segundos. Pensei:
"Um dia conto a eles como é".
FOLHA - Qual a mensagem do espetáculo?
KYLIÁN - Todo o meu trabalho é
sobre amor e morte, mesmo
quando faço algo sarcástico. É
com isso que lidamos o tempo
todo. Quem amar, o que amar.
Mas também lidamos com o
porquê de estarmos aqui, como
e quando vamos morrer, o que
será depois. É muito tocante
ver jovens como essas crianças
que vão para o Brasil dançando
a morte.
FOLHA - Poderia explicar o seu método de criação?
KYLIÁN - Posso dizer uma coisa.
Se você vê meus trabalhos, eles
são muito diferentes uns dos
outros. Porque o corpo não tem
limites no que diz respeito a
movimentos, e também o cérebro é um universo em miniatura. Usamos uma parte muito limitada do cérebro, e o corpo de uma maneira nem tão interessante. Coreógrafos podem
abrir portas para mostrar que
instrumento louco é o corpo, o
que podemos fazer com ele. Para isso, preciso da colaboração
dos dançarinos, sempre. Eles
me dão idéias, me inspiram.
FOLHA - Por que os bailarinos da
NDT têm de ter formação clássica?
KYLIÁN - O balé clássico dá uma
força e uma resistência que dificilmente eles teriam com outras técnicas. Outros coreógrafos podem não precisar, mas eu
preciso dessa base clássica para
criar, mesmo que às vezes não
use nada dela.
FOLHA - Coreógrafos brasileiros lamentam uma certa dificuldade em
atrair público para a dança no país.
Existe um segredo?
KYLIÁN - As pessoas se sentem
intimidadas pelo que não entendem. É preciso deixar claro
o que tentamos fazer. Fico feliz
quando o público oferece tempo e dinheiro para me ver, então tenho a obrigação de dar algo em troca. Eu espero que eles
levem para casa algo valioso. Se
há qualidade, as pessoas definitivamente vêm ver. A dança
costumava ser o patinho feio
das artes e não é mais, porque
fizemos um trabalho que permitiu a ela ser tão respeitada
quanto a literatura, as artes
plásticas. Quando comecei a
dançar, ainda garoto, diziam
que eu era maluco. "Ok, você
vai dançar, mas como vai fazer
dinheiro?". Hoje, se alguém
quer ser bailarino, é normal.
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