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Crítica/jazz
Saxofonista Joe Henderson volta em obra-prima dos anos 90
CARLOS CALADO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O
tempo é a prova definitiva para se avaliar um
clássico. Fora de catálogo há pelo menos dez anos,
um best-seller do jazz da década de 90 retorna ao mercado
brasileiro.
Apenas por ter consagrado a
arte do saxofonista Joe Henderson (1937-2001), o álbum
"Lush Life - The Music of Billy
Strayhorn" já mereceria um
destaque na história desse gênero, mas ouvi-lo de novo hoje
confirma a primeira impressão.
Trata-se de uma obra-prima.
Lançado originalmente em
1992, esse álbum serviu de veículo para um merecido e tardio
reconhecimento: conduziu
Henderson, aos 55 anos, pela
primeira vez ao topo da parada
de jazz da Billboard. Até então,
o nome desse original músico
norte-americano só circulava
entre os críticos e alguns aficionados que cultuavam suas gravações, muitas delas lançadas
por selos alternativos.
Marketing
O marketing da gravadora
Verve contribuiu, naquela época, para apresentar a um público mais amplo um jazzista maduro cujo estilo não devia nada
ao de John Coltrane, maior influência entre os saxofonistas
desde o final dos anos 50. Por
coincidência ou não, o CD
"Lush Life" rendeu até um
Grammy para Henderson. Sem
falar na prestigiosa revista
"Down Beat", que também fez
justiça tardia ao saxofonista,
conferindo-lhe os prêmios de
melhor álbum e melhor músico
de jazz de 1992.
O álbum de Henderson também teve o mérito de lançar um
novo olhar sobre a obra de Billy
Strayhorn (1915-1967), o autor
de todas as faixas. A excessiva
timidez deste brilhante compositor e arranjador
norte-americano
contribuiu para que
ele ocupasse uma
posição secundária
na orquestra de Duke Ellington, com o
qual manteve uma
longa parceria.
Nas gravações,
Henderson teve a
seu lado um grupo
de ótimos músicos,
bem mais jovens que
ele: o pianista Stephen Scott, o contrabaixista Christian
McBride e o baterista Greg Hutchinson,
além do então já badalado trompetista
Wynton Marsalis.
Eles se revezam, formando duos, trios,
quartetos e quintetos com o líder, uma
receita instrumental
que enriquece as dez
faixas com muita variedade sonora.
"Isfahan", tema de abertura
do disco, já chama a atenção pela elegância do saxofonista, em
um duo bem intimista com o
baixo acústico de McBride.
Henderson era um jazzista de
tendência mais temática, que
costumava construir seus improvisos dentro das estruturas
harmônicas das composições.
Neles, introduzia com freqüência frases e fragmentos melódicos que soavam como marcas
registradas.
Esse estilo personalíssimo era
descrito pelo próprio músico com o
auxílio de uma metáfora literária.
"Quando toco, me
vejo como um escritor: alguém que
associa palavras,
criando imagens
com as notas. Tento contar uma história com elas",
disse ele à Folha,
em 1993, pouco
antes de vir ao Brasil para um tributo
a Tom Jobim, no
Free Jazz.
Henderson esbanja sensualidade e controle do
sax tenor, na suave
balada "Blood
Count", muito
bem acompanhado pelas intervenções do piano de Scott. Dá um
show de suingue no saboroso
calipso "Rain Check", impulsionado pelos tambores e pratos de Hutchinson. O baterista
também se destaca numa longa
versão de "Take the "A" Train",
a mais popular composição de
Strayhorn, que se tornou tema
oficial da Duke Ellington Orchestra. Duas performances de
tirar o fôlego.
Frases ellingtonianas
Interpretada em andamento
bem lento, a romântica balada
"A Flower Is a Lovesome
Thing" serve de trilha para langorosos solos de Henderson e
Marsalis. E Scott se diverte, no
acompanhamento, decalcando
frases tipicamente ellingtonianas, como já fizera antes, na
sensível "Lotus Blossom".
A faixa de encerramento não
poderia ser mais bem escolhida. Recriando com muita liberdade e sensibilidade a bela melodia da composição que dá título ao álbum, Henderson imprime nela sua assinatura sonora, como se estivesse tocando em casa, da maneira mais
descontraída.
Se você gosta de jazz e ainda
desconhece esta obra-prima do
grande mestre do sax tenor,
não perca esta nova chance.
LUSH LIFE
Artista: Joe Henderson
Gravadora: Verve/Universal
Quanto: R$ 30, em média
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