São Paulo, Quarta-feira, 07 de Julho de 1999
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A imagem da juventude do fim do século 20

da Redação


Kate Moss é filha de um agente de viagens e sempre viajou bastante. Foi num aeroporto que foi "descoberta", aos 14 anos, em Nova York, durante um problema de vôo que a deixou três dias no John Fitzgerald Kennedy. Enquanto seu pai gritava num guichê, ela foi vista por uma scouter (caça-talentos) da agência Storm.
Fez algumas fotos para a agência e o primeiro trabalho, para a revista "Mizz". Até que uma polaroid sua foi vista na Storm pela fotógrafa Corinne Day, que decidiu fotografá-la para a revista "The Face". Day é uma ex-modelo, também uma rebelde do início da década de 90, que tinha como característica um estilo despojado, em que as fotos ganhavam teor doméstico, com situações comuns. Desglamourizada mesmo.
A estética ia de encontro à ostentação de dinheiro e de roupas celebrada durante os anos 90. Da América, vinha a revolução jovem pregada com o barulho do grunge e a nonchalance de suas moda. Pronto. Estavam no ar os elementos para o segundo terremoto jovem deste século.
Kate liderou a onda das chamadas gamines, as "girls next door" dos 90. Como Twiggy nos anos 60, as modelos tinham de ter corpo miúdo e ar comum -apesar de serem bastante fotogênicas.
Em três anos, Kate havia sido fotografada por tops como Steven Meisel, Bruce Weber, Herb Ritts, Helmut Newton e assinado o contrato com a Calvin Klein, que a projetou mundialmente. O olhar de Kate para a publicidade da marca, desafiador e algo entediado, sintetizou a atitude de toda uma geração.
Seu namorado então era o também fotógrafo Mario Sorrenti, um ex-modelo que deu ao mundo algumas das mais lindas imagens de Kate, como a campanha para o perfume Obsession. Num clima algo Gauguin, ela aparece deitada de costas, num sofá preto detonado, nua, como se esperasse o contato com o observador/vouyer.
Corinne Day subiu junto com Kate e chegou ao mainstream, à "Vogue" inglesa. Suas fotos perturbaram todas as adolescentes do país, que entraram em dietas selvagens para tentar se parecer com a modelo. Médicos contavam em entrevistas que meninas chegavam em seus consultórios com as fotos de Kate: "Quero ficar assim". Kate passou a ser acusada de estimular a anorexia. Foi o primeiro choque em relação à mídia.
Durante os cinco anos seguintes, Kate virou cartazes na Times Square, ônibus e incontáveis páginas de revistas. Em desfiles, sua figura mignon contrastava com o poderio das supermodels e seu indefectível andar entrou também para nosso imaginário. Vieram coleções incríveis para o inglês John Galliano, especialmente aquela em que ela interpretava uma princesa russa imaginária, correndo pela neve, fugindo. Registrada para a história num documentário, Galliano gritava para ela num ensaio: "Think Penn!" (pense em Irving Penn, mestre da fotografia do glamour).
Fora das passarelas, Kate consolidava sua trajetória de "party girl", com fotos na mídia com cigarro e copo na mão, dançando nas fechadíssimas e glamourosas festas do Planeta Fashion. O namoro com o pop star Johnny Depp confirmava as modelos como as estrelas de nossa era.
No final de 98, em meio a pencas de boatos, a bomba: Kate se interna para uma clínica de reabilitação. Ficou lá cinco semanas e deixou a casa de repouso antes do Natal e deu entrevistas a revistas de estilo inglesas relatando seus hábitos, que as modelos sempre bebem champanhe antes dos desfiles, mesmo às 10h. "Eu perdi o controle. Eu não tinha meus pensamentos claros. Eu estava sempre de ressaca", disse a "The Face" de março. Fez sua volta com um desfile para a marca Versace em Milão e logo depois fez a temporada de alta-costura em Paris.
A década chega ao fim e, até por sua trajetória, Kate permanece como a imagem de todos esses valores controversos do mundo da moda. A desilusão, a perda da inocência, seu rosto representa tudo isso.
No Brasil, em 4 de julho de 1999, pudemos ver toda a essência da juventude desta década. O novo século está aí. Kate também. (EP)


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