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Peça traz Quixote e Sancho Pança para o Nordeste
Autor da versão, Ruy Guerra diz que se ateve aos grandes temas do clássico do séc. 17, mas se permitiu "iconoclastias"
Com Edson Celulari no papel-título, espetáculo incorpora cordelistas, romeiros e brincantes ao imaginário quixotesco
LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais de 400 anos de andanças em defesa do ideal de justiça fizeram o fidalgo Dom Quixote deixar a La Mancha natal
na distância e vir bater nestas
terras. É no sertão nordestino,
onde passa a atender pelo nome de Queixada, que o personagem de Miguel de Cervantes
e seu escudeiro Sancho Pança
perambulam em "Dom Quixote de Lugar Nenhum", espetáculo com Edson Celulari no papel-título que estréia em São
Paulo hoje, depois de passar
por Salvador, Natal e Recife.
Quem traz a dupla para peregrinar na caatinga é Ruy Guerra, 76, autor da adaptação do
clássico medieval. Em pleno
agreste, os desvarios se mantêm: Quixote busca tanto um
dragão que o permita provar
sua valentia quanto a amada
Dulcinéia -mais uma fabulação de seu inconsciente.
O cenário nordestino, entretanto, convida a algumas liberdades poéticas. É por isso que
cruzam o caminho dos cavaleiros retirantes, romeiros, brincantes e cordelistas. Também
há citações aos ritmos da região, como frevo, xote e maracatu, que dão ao espetáculo
ares de comédia musicada.
"A cultura nordestina é muito hispânica, de certa forma, no
seu vocabulário e em uma série
de heranças culturais. A própria paisagem árida remete à
Castela [região espanhola em
que está a comarca de La Mancha], que é desértica. [Apesar
dos ajustes], me ative aos grandes temas do "Dom Quixote': o
sonho, a loucura, a poesia e a integridade, traduzidos em solilóquios com linguajar nordestino", diz Guerra.
O autor lista entre suas sutis
"iconoclastias" a escolha de um
proprietário ilustre para o dragão com quem Queixada quer
duelar e a revelação, a certa altura, de uma "segunda pele" de
Sancho Pança. "Para os puristas, pode resultar em surpresa",
avisa.
Adaptar era loucura
O protagonista Celulari, 49,
conta que ele e o amigo Ernesto
Piccolo, que dirige a peça, planejavam levar a história aos
palcos há tempos. Três anos
atrás, quando morreu a mãe do
diretor -que havia presenteado Celulari com o calhamaço de
Cervantes-, decidiram que era
hora de tirar o projeto da gaveta. "E encontramos o louco certo para fazer a adaptação",
brinca, referindo-se a Guerra.
O trabalho consumiu um ano.
Para o ator, o traço idílico da
saga do Cavaleiro da Triste Figura não ficou datado "porque
ele realiza aquilo que todos nós
queremos: ser o outro. Ele acredita ser o cavaleiro andante, crê
na utopia, e nisso tem muito da
pureza infantil".
Também produtor da peça,
Celulari diz que a função (já assumida em "Fim de Jogo", de
Beckett) lhe permite encarnar
"personagens mais densos". "O
fato de me "autoproduzir" me dá
a possibilidade de estimular
um lado artístico maior do que
na TV e no cinema. Porque aí
escolho o texto que quero, junto as pessoas que quero. Sou
um ator por excelência, e esse
ator tem ambições."
O desejo de vôos artísticos
mais altos não o faz virar as costas para o meio que o projetou.
A partir de novembro, ele grava
"Beleza Pura", próxima novela
das sete da TV Globo. Na trama
de Andrea Maltarolli (com supervisão de Sílvio de Abreu), viverá o mulherengo engenheiro
aeronáutico Guilherme, que terá a carreira posta em xeque
quando uma peça fabricada por
ele for apontada como a causa
de um acidente aéreo.
DOM QUIXOTE DE LUGAR NENHUM
Onde: teatro shopping Frei Caneca
(r. Frei Caneca, 569, tel. 0/xx/11
3472-2229)
Quando: estréia hoje, às 21h30;
sáb., às 20h e às 22h30; dom., às
18h; até 30/9
Quanto: R$ 80 (meia: R$ 40)
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