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Documentário aborda o amor e o ódio a Bob Dylan
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Nasci muito distante de onde
eu deveria estar, então estou voltando para casa", diz Bob Dylan
logo no começo de "No Direction
Home", o documentário dirigido
por Martin Scorsese que reconta a
história do cantor, destacando o
período entre 1961 e 1966 -de
seu surgimento como cantor folk
até o momento em que é tachado
de "Judas" por se apresentar tocando rock e com uma banda.
O filme, de quase três horas e
meia, estréia no Brasil no encerramento do Recine, no Rio, na próxima sexta (11/11), às 21h. Ao longo dele, o espectador vai sendo
apresentado ao complexo personagem que é Robert Zimmerman,
desde sua infância no interior dos
Estados Unidos até sua transformação no ídolo Bob Dylan e, depois, no traidor dos anseios de
uma geração, por ousar seguir seu
caminho alheio ao maniqueísmo
da política que se refletia na sociedade da década de 1960.
A obra de Scorsese é uma coleção de raridades: desde a oportunidade de ouvir Dylan falando sobre si mesmo abertamente -ou
tão claramente quanto ele consegue- até as cenas de apresentações históricas do cantor, como a
de 21 de maio de 1966, em Newcastle (Inglaterra), quando boa
parte da platéia vaia ruidosamente a música "Like a Rolling Stone".
O título do filme ("sem o rumo
de casa", em português) é tirado
de um verso da canção ("how
does it fell / to be on your own,/
with no direction home?", que pode ser traduzido para "como é /
estar sozinho,/ sem o rumo de casa?" ), que simboliza também o
auge da "traição" de Dylan em relação a seu passado folk: é uma
música elétrica, com guitarra e órgão, e com uma letra que foi, então, interpretada como individualista e egoísta -o exato oposto do
que os cantores e fãs de músicas
de protesto achavam que Dylan
fazia e deveria continuar fazendo.
Os depoimentos dos fãs logo
após o concerto de Newport deixam claro o tamanho do estrago.
"Ele ficou comercial, com aquele
grupo de apoio (...). Acho que ele
está cedendo a uma espécie de
gosto popular. Acho que ele está
se prostituindo", diz um deles.
"Um artista precisa se cuidar
para nunca chegar a um ponto em
que ele acha que já viu tudo. Tem
sempre que entender que deve ficar constantemente em transformação", defende-se Dylan, brandindo o estilo "pedra rolante" que
mantém o rock se movendo.
Outro grande momento do filme destaca as turbulentas relações de Dylan com a mídia, muitas vezes inconveniente (e outras
realmente irritante) em sua avidez por entender e rotular.
O filme de Scorsese é nitidamente uma obra de fã, mas não se
exime de mostrar que o ídolo é,
antes de tudo, humano. Mentiras,
o roubo de uma coleção de discos
de um amigo, o egoísmo e a desconsideração com sua namorada
da época, a cantora Joan Baez, tudo aparece no documentário. No
fim, emerge um Bob Dylan mais
compreensível, em sua viagem de
volta para lugar nenhum.
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