São Paulo, Sábado, 08 de Janeiro de 2000


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Terra de caubói

Francio de Hollanda/Folha Imagem
Adriana Andrade (à dir.), 25, operadora de telemarketing de Campinas, que gasta até R$ 1.000 por mês viajando com amigos para cidades onde há rodeios



Mapa cultural mostra que número de cidades que promovem rodeios em SP é cinco vezes maior do que o das que possuem cinemas


DANIEL CASTRO
ROBERTO DE OLIVEIRA
da Reportagem Local

Lins, cidade de 61 mil habitantes e 8.000 estudantes universitários, já teve dois cinemas tradicionais. O último fechou há quatro anos. No ano passado, virou templo da Igreja Universal do Reino de Deus. Destino semelhante tiveram outras 800 salas no Estado de São Paulo nos últimos 20 anos.
Quem mora em Lins tem de viajar no mínimo 60 quilômetros para ir ao cinema mais próximo. Mas, por outro lado, não precisa nem sair do bairro em que vive para ir a uma festa de peão de boiadeiro. Na cidade, aconteceram sete rodeios em 99, um principal e outros seis "menores", nos bairros e distritos, reunindo, cada um, pelo menos 5.000 pagantes.
Com vocação para a pecuária, Lins (a 453 km a noroeste de São Paulo) é um exemplo do perfil cultural de São Paulo. No Estado mais industrializado do país, predomina a cultura rural. São Paulo é uma terra de caubóis.
É o que revela o primeiro, e inédito, mapeamento de equipamentos culturais no Estado de São Paulo, feito pelo Fórum São Paulo Século 21, da Assembléia Legislativa, com base em pesquisa da Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados).
Segundo o levantamento, em 390 (60,5%) dos 645 municípios paulistas as prefeituras promovem ou patrocinam festas de peão de boiadeiro. Mas apenas 73 cidades (11,3%) possuem cinemas.
"O rodeio conquista adeptos a cada dia. É um espetáculo circense, mas muito mais pobre do que o circo", diz o sociólogo Gabriel Bolaffi sobre o fenômeno.
A pesquisa revela que cinemas, assim como teatros, são hoje privilégios de cidades grandes. Ao contrário, rodeios são eventos típicos de cidades pequenas.
Nas 73 cidades em que existem cinemas moram 22,5 milhões de pessoas (65% da população do Estado). As 390 que promovem rodeios representam só 33,4% dos paulistas (11,5 milhões).
Há municípios, como Barra do Chapéu (cerca de 330 km de São Paulo), em que o rodeio é o único evento esportivo-cultural disponível aos seus 5.022 moradores.
Já em São Paulo, a capital, há uma lei (nº 11.359/93) que proíbe rodeios, supostamente para proteger os animais de maus-tratos.
Dados que não constam no mapeamento reforçam ainda mais que a indústria do rodeio é muito maior do que a cinematográfica.
Dos cerca de 1.300 rodeios espalhados pelo país no ano passado, São Paulo concentrou 650, com pelo menos 13 milhões de pagantes. A indústria country paulista movimentou mais de US$ 1 bilhão em 99, segundo a FNRC (Federação Nacional do Rodeio Completo), responsável pelos principais eventos do Brasil.
De acordo com o Sindicato dos Distribuidores do Rio de Janeiro, o Estado de São Paulo tem 25,4% das salas do país. Logo, proporcionalmente, em 99 seus cinemas tiveram 17,8 milhões de espectadores (foram 70 milhões no país) e arrecadaram R$ 88,9 milhões (R$ 350 milhões no Brasil).
Para o secretário estadual de Cultura, Marcos Mendonça, o mapa mostra "que São Paulo tem uma vida rural muito intensa" e que "preserva raízes".
Ex-secretária-executiva do Ministério da Cultura e autora do estudo "Os Indicadores Quantitativos da Cultura" (98), Maria Delith Balaban ameniza o fator "raízes rurais" ou "Estado caipira": "As festas de peão batem diretamente na música sertaneja, que é uma indústria fortíssima".


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