São Paulo, quinta-feira, 08 de janeiro de 2009

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Análise

Compositor de muitas faces é unanimidade globalizada

JOÃO BATISTA NATALI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Uma prova quantificada de popularidade: no site da Amazon, Heitor Villa-Lobos aparece em nada menos que 1.195 CDs. No YouTube, são perto de 20,6 mil os vídeos postados com sua música. É provável que nenhum outro compositor brasileiro -e não só os eruditos- exiba números tão eloquentes.
Villa-Lobos virou uma espécie de unanimidade, reforçada pelo envelhecimento da barreira que no Brasil dividia a música entre a nacionalista, corrente que ele liderou, e a produzida pela vanguarda ligada ao atonalismo europeu.
A separação permanece no repertório, mas as discussões que ela despertou são agora coisa historiográfica.
Há muitos Villa-Lobos no mesmo compositor, em razão do tamanho e de certa desigualdade de sua obra. Seu catálogo de 1.500 composições inclui nove "Bachianas", 14 choros, 18 concertos, cinco deles para piano, 12 sinfonias, 17 quartetos de cordas e canções e peças para piano.
O compositor nasceu musicalmente numa época em que o Brasil se preocupava com sua identidade cultural. A questão fora levantada por um grupo brilhante de precursores -Leopoldo Miguez, Glauco Velasquez, Alberto Nepomuceno-, mas foi ele quem assumiu uma posição dogmática, apesar da influência que recebeu de Bach, Stravinsky ou Debussy.
O projeto, presente no movimento modernista, consistia em mergulhar nas tradições populares para delas extrair regras harmônicas capazes de gerar uma produção que poderia apenas transcrever peças infantis, retrabalhar temas folclóricos ou, com uma maior complexidade, escrever algo gigantesco como o "Choros nº 10", para coral e orquestra sinfônica (está nele o belíssimo "Rasga Coração").
De início violoncelista e violonista, sua "força vulcânica" (expressão de Otto Maria Carpeaux) contentava praticantes de qualquer instrumento, do violão ("Choros nº 1", os 12 "Estudos" e os cinco "Prelúdios") ao saxofone, em seu tempo objeto de um forte preconceito.

Contexto favorável
Villa-Lobos beneficiou-se de circunstâncias favoráveis. Foi a estrela musical da Semana de 1922 e, no ano seguinte, seguia para Paris, então capital da cultura. Teve entre seus intérpretes o pianista polonês Arthur Rubinstein e, por uma questão de afinidade nacionalista, associou-se ao Estado Novo (1937-1945), que fez dele uma espécie de músico oficial.
Paralelamente ou depois dele, o Brasil continuou a ter grandes compositores -Camargo Guarnieri, Francisco Mignone, Gilberto Mendes, Marlos Nobre-, mas nenhum se transformou em unanimidade globalizada. Talvez porque Villa-Lobos, em suas peças mais conhecidas, tenha sido um melodista superlativo, como nas cantilenas das "Bachianas" de números 4 e 5, com certeza entre as músicas mais bonitas já escritas no Brasil.


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