|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Análise
Compositor de muitas faces é unanimidade globalizada
JOÃO BATISTA NATALI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Uma prova quantificada
de popularidade: no site da Amazon, Heitor
Villa-Lobos aparece em nada
menos que 1.195 CDs. No YouTube, são perto de 20,6 mil os
vídeos postados com sua música. É provável que nenhum outro compositor brasileiro -e
não só os eruditos- exiba números tão eloquentes.
Villa-Lobos virou uma espécie de unanimidade, reforçada
pelo envelhecimento da barreira que no Brasil dividia a música entre a nacionalista, corrente que ele liderou, e a produzida
pela vanguarda ligada ao atonalismo europeu.
A separação permanece no
repertório, mas as discussões
que ela despertou são agora
coisa historiográfica.
Há muitos Villa-Lobos no
mesmo compositor, em razão
do tamanho e de certa desigualdade de sua obra. Seu catálogo
de 1.500 composições inclui
nove "Bachianas", 14 choros, 18
concertos, cinco deles para piano, 12 sinfonias, 17 quartetos de
cordas e canções e peças para
piano.
O compositor nasceu musicalmente numa época em que o
Brasil se preocupava com sua
identidade cultural. A questão
fora levantada por um grupo
brilhante de precursores
-Leopoldo Miguez, Glauco Velasquez, Alberto Nepomuceno-, mas foi ele quem assumiu
uma posição dogmática, apesar
da influência que recebeu de
Bach, Stravinsky ou Debussy.
O projeto, presente no movimento modernista, consistia
em mergulhar nas tradições
populares para delas extrair regras harmônicas capazes de gerar uma produção que poderia
apenas transcrever peças infantis, retrabalhar temas folclóricos ou, com uma maior
complexidade, escrever algo gigantesco como o "Choros nº
10", para coral e orquestra sinfônica (está nele o belíssimo
"Rasga Coração").
De início violoncelista e violonista, sua "força vulcânica"
(expressão de Otto Maria Carpeaux) contentava praticantes
de qualquer instrumento, do
violão ("Choros nº 1", os 12 "Estudos" e os cinco "Prelúdios")
ao saxofone, em seu tempo objeto de um forte preconceito.
Contexto favorável
Villa-Lobos beneficiou-se de
circunstâncias favoráveis. Foi a
estrela musical da Semana de
1922 e, no ano seguinte, seguia
para Paris, então capital da cultura. Teve entre seus intérpretes o pianista polonês Arthur
Rubinstein e, por uma questão
de afinidade nacionalista, associou-se ao Estado Novo (1937-1945), que fez dele uma espécie
de músico oficial.
Paralelamente ou depois dele, o Brasil continuou a ter
grandes compositores -Camargo Guarnieri, Francisco
Mignone, Gilberto Mendes,
Marlos Nobre-, mas nenhum
se transformou em unanimidade globalizada. Talvez porque
Villa-Lobos, em suas peças
mais conhecidas, tenha sido
um melodista superlativo, como nas cantilenas das "Bachianas" de números 4 e 5, com certeza entre as músicas mais bonitas já escritas no Brasil.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Cronologia: A vida de Heitor Villa-Lobos Índice
|