São Paulo, sexta-feira, 08 de fevereiro de 2002

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CINEMA/ESTRÉIA

"DUAS VEZES COM HELENA"

Longa de Mauro Farias é baseado em conto homônimo de Paulo Emílio Salles Gomes

Cineasta homenageia crítico com filme

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

"Duas Vezes com Helena", longa de Mauro Farias que estréia hoje, é um filme-homenagem.
No ato de transpor para o cinema um conto do crítico Paulo Emílio Salles Gomes, Farias viu mais que a possibilidade de diálogo com o autor literário. "Eu me senti retribuindo o crítico."
O cineasta diz que jamais considerou a hipótese de deslocar elementos do conto, como o tempo em que se desenrola (os anos 40 e os 70), por exemplo. "Não vejo como alterá-lo. O conto acaba sendo a visão de uma época", diz.
Mas, para evitar o tom excessivamente respeitoso, Farias retomou a sensação que se impôs ao dirigir alguns dos mais reconhecidos atores brasileiros. "Você se vê diante de monstros sagrados como Paulo Autran, Fernanda Montenegro, Marília Pêra e não adianta mitificar, tem de estar desinibido e com coragem."
No texto de Paulo Emílio, são dois os aspectos que Farias considera mais destacados: "o pano de fundo histórico e o caráter de absurdo quase folhetinesco, em que tudo soa falso e precário".
A história apresenta o jovem estudante Polydoro (Fabio Assunção) flertando com o nazismo antes da eclosão da Segunda Guerra, embora tenha na figura do professor liberal Alberto (Carlos Gregório) um dedicado preceptor.
A incontornável paixão pela mulher do professor, Helena (Christine Fernandes), faz com que mestre e discípulo se afastem por 30 anos. No reencontro do triângulo, as condições históricas estão representadas pelo desfecho trágico da atividade política do filho do casal, num Brasil subjugado pelo regime militar. E o "absurdo" dos comportamentos pessoais também se revela de golpe.
Farias entremeou a narração dos atores com numerosas imagens de arquivo, utilizadas na forma de "back projection". Ou seja, no mais das vezes, os filmes inseridos saltam de algum ponto no fundo do cenário. A escolha do recurso, de acordo com o cineasta, pareceu coerente com "o fundo falso dos personagens, o terreno movediço em que se encontram".
"Duas Vezes com Helena" competiu no Festival de Gramado no ano passado e não obteve Kikitos. Num ano de filmes dominados por atores, o júri da mostra premiou Isabel Guéron como melhor atriz, alçando a protagônico o seu papel -de fato lateral- em "Bufo & Spallanzani", de Flávio Tambellini.
"O trabalho de Christine é ingrato. Ela está sempre artificial, não como atriz, mas porque a personagem exige. As pessoas às vezes confundem isso", diz Farias.
Se para o papel da dissimulada Helena o diretor apostou em alguém "que ainda não tinha nome projetado e queria fazer cinema", no caso de Polydoro escolheu pela adequação que observa entre ator e personagem. "Além de gostar do trabalho de Fabio, que conhecia da TV, achei que ele tinha tudo a ver com esse homem ingênuo, franco, que entra na vida confiante na humanidade."
"Duas Vezes com Helena", segundo longa de Farias, fechou um intervalo de oito anos em sua carreira no cinema ("Não Quero Falar sobre Isso Agora", 93). O cineasta desenvolve agora dois projetos - "o de um "western-spaghetti" sobre a corrida do ouro no Brasil e outro mais autobiográfico, sobre um diretor de TV e cinema que tenta fazer com que seu trabalho seja coerente com seu ponto de vista sobre a realidade".


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