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Crítica/"Sweeney Todd"
Nas mãos de Tim Burton, sanguinolência não é obscena
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Tim Burton é um cineasta que sabe deixar marcas, um diretor capaz
de distinguir sua assinatura no
interior de uma indústria que
privilegia a eficiência impessoal. A prova mais evidente de
sua personalidade vem à tona
quando assume trabalhos de
encomenda, como é o caso de
"Sweeney Todd - O Barbeiro
Demoníaco da Rua Fleet".
Na origem, o filme foi um
musical da Broadway. Com
canções compostas por Stephen Sondheim, o espetáculo
era, por sua vez, a adaptação de
uma peça assinada pelo dramaturgo Christopher Bond, que
narra a história de vingança
sanguinolenta de um barbeiro
na Londres do século 19.
Com o sucesso do musical, a
produtora DreamWorks adquiriu os direitos para o cinema,
e Tim Burton foi convidado para dirigi-lo, o que não impede
que "Sweeney Todd" seja um
dos mais burtonianos títulos de
sua filmografia.
Sua personalidade se identifica, de cara, pelo tratamento
visual que o diretor dá a seus filmes. Burton é um grande herdeiro do cinema de fantasia, em
que a imagem é elemento essencial na criação de um universo que parece saído dos sonhos ou da pura imaginação.
Tal como o estilo de Fellini, o
de Burton não apela para a imageria como um efeito bibelô.
Ela vem dar corpo a um procedimento que consiste em se
distanciar do realismo para alcançar significados de um modo tão mais brutal quanto mais
disfarçado de encantamento.
E é essa estratégia que se encontra a pleno vapor em "Sweeney Todd". A vingança do barbeiro (encarnado maravilhosamente por Johnny Depp, em
companhia de uma Helena
Bonham Carter assombrosa) se
intensifica no visual gótico com
que Burton recria a Londres da
época. E, mais ainda, no vermelho que escorre do pescoço de
suas vítimas. "Não é sangue, é
vermelho", dizia Godard em
uma de suas tantas fórmulas ricas de sentido. A sanguinolência que se vê na tela não segue a
vocação da obscenidade, habitual nos filmes de gênero terror. Junto ao negror dos cenários, é a vermelhidão da vingança a paixão que ele pinta.
"Sweeney Todd" dá continuidade aos dois "Batman" dirigidos por Burton, outro herói
mergulhado na escuridão e movido por um desejo de vingança. Como Edward Mãos de Tesoura, outra criação de Burton, Sweeney Todd usa as mãos para realizar sua "obra". Ambos
são também alter ego de um artista que se distingue não por
suas bizarrices, mas por seu
monstruoso talento.
SWEENEY TODD - O BARBEIRO
DEMONÍACO DA RUA FLEET
Produção: EUA/Inglaterra, 2007
Direção: Tim Burton
Com: Johnny Depp, Helena Bonham
Carter e Alan Rickman
Onde: Bristol, Eldorado e circuito
Avaliação: ótimo
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