São Paulo, sexta-feira, 08 de fevereiro de 2008

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Crítica/"Sweeney Todd"

Nas mãos de Tim Burton, sanguinolência não é obscena

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Tim Burton é um cineasta que sabe deixar marcas, um diretor capaz de distinguir sua assinatura no interior de uma indústria que privilegia a eficiência impessoal. A prova mais evidente de sua personalidade vem à tona quando assume trabalhos de encomenda, como é o caso de "Sweeney Todd - O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet".
Na origem, o filme foi um musical da Broadway. Com canções compostas por Stephen Sondheim, o espetáculo era, por sua vez, a adaptação de uma peça assinada pelo dramaturgo Christopher Bond, que narra a história de vingança sanguinolenta de um barbeiro na Londres do século 19.
Com o sucesso do musical, a produtora DreamWorks adquiriu os direitos para o cinema, e Tim Burton foi convidado para dirigi-lo, o que não impede que "Sweeney Todd" seja um dos mais burtonianos títulos de sua filmografia.
Sua personalidade se identifica, de cara, pelo tratamento visual que o diretor dá a seus filmes. Burton é um grande herdeiro do cinema de fantasia, em que a imagem é elemento essencial na criação de um universo que parece saído dos sonhos ou da pura imaginação.
Tal como o estilo de Fellini, o de Burton não apela para a imageria como um efeito bibelô. Ela vem dar corpo a um procedimento que consiste em se distanciar do realismo para alcançar significados de um modo tão mais brutal quanto mais disfarçado de encantamento.
E é essa estratégia que se encontra a pleno vapor em "Sweeney Todd". A vingança do barbeiro (encarnado maravilhosamente por Johnny Depp, em companhia de uma Helena Bonham Carter assombrosa) se intensifica no visual gótico com que Burton recria a Londres da época. E, mais ainda, no vermelho que escorre do pescoço de suas vítimas. "Não é sangue, é vermelho", dizia Godard em uma de suas tantas fórmulas ricas de sentido. A sanguinolência que se vê na tela não segue a vocação da obscenidade, habitual nos filmes de gênero terror. Junto ao negror dos cenários, é a vermelhidão da vingança a paixão que ele pinta.
"Sweeney Todd" dá continuidade aos dois "Batman" dirigidos por Burton, outro herói mergulhado na escuridão e movido por um desejo de vingança. Como Edward Mãos de Tesoura, outra criação de Burton, Sweeney Todd usa as mãos para realizar sua "obra". Ambos são também alter ego de um artista que se distingue não por suas bizarrices, mas por seu monstruoso talento.


SWEENEY TODD - O BARBEIRO DEMONÍACO DA RUA FLEET
Produção:
EUA/Inglaterra, 2007
Direção: Tim Burton
Com: Johnny Depp, Helena Bonham Carter e Alan Rickman
Onde: Bristol, Eldorado e circuito
Avaliação: ótimo


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