São Paulo, sexta-feira, 08 de março de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Colagem de músicas é nova mania entre jovens europeus e ganha adesão do "mainstream"

Pop bastardo

THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Parido a partir dos computadores de entediados jovens europeus, um novo meio de fazer música começa a chamar a atenção de indústria e imprensa especializadas: o "bastard pop" (pop bastardo). Desde o punk o conceito "faça você mesmo" nunca se encaixou tão bem a um gênero.
A idéia é simples: juntar e/ou sobrepor duas ou mais canções conhecidas, gerando "cria" às vezes mais excitante do que as originais. Exemplo: "A Stroke of Genius" ("duelo" dos Strokes com a pós-teen Christina Aguilera).
Astros pop já estão embarcando na onda "bastard" -ou "hybrid tunes", "mash-up", "bootleg"-, que congestiona sites de down- load na internet. Em sua apresentação no último Brit Awards, dia 20 de fevereiro, Kylie Minogue cantou a sua "Can't Get You Out of My Head" em cima da base de "Blue Monday", clássico do New Order. A australiana gostou tanto que vai lançar a versão em single.
Nesta semana, nas passarelas de Milão, a estilista Consuelo Castiglioni colocou como trilha sonora de seu desfile de alta-costura "Get UR Faith On", mix de canção da diva hip hop Missy Elliott com George Michael. No ano passado, esse "bastard" foi tocado em horário matinal na Radio 1 inglesa pela DJ/musa Sara Cox. No mesmo dia, o próprio Michael ligou à emissora para saber onde conseguiria descolar a música...
Mais: outra rádio inglesa, a Xfm, colocou em sua programação "A Stroke of Genius". Mas, em quatro dias, teve que tirá-la do ar após ser ameaçada judicialmente por uma gravadora. "Todo mundo queria essa faixa. Recebemos ligações da Radio 1, Virgin [rádio], NME [New Musical Express] implorando por aquela música", disse à Folha Edward Temple-Morris, DJ da Xfm.
Nos últimos meses, "bastard pop" virou febre entre adolescentes europeus. "Toda semana chegam cerca de cem "bootlegs" para nós. A maioria não tem qualidade, mas, no meio disso, sempre descobre-se uma pérola", afirma Temple-Morris.
Foi assim que a emissora descobriu "A Stroke of Genius". A versão foi criada por um jovem inglês conhecido por The Freelance Hellraiser. "Eu sabia que "Genie in a Bottle" [Christina Aguilera" era uma canção lenta, enquanto "Hard to Explain] [Strokes] tinha quase o dobro de sua velocidade nos vocais. Foi apenas uma questão de sorte que, apesar disso, elas funcionaram tão bem juntas", disse o DJ à Folha.
Segundo Hellraiser, a inspiração para cair no mundo "bastard pop" veio de Fatboy Slim. "Ouvi um mix que ele fez com uma música do Outkast [dupla de hip hop" e decidi que era aquilo que eu queria fazer."
O top DJ, que esteve no Brasil para o Free Jazz do ano passado, é responsável por um já clássico do gênero: "The Satisfaction Skank", resultado de sua "The Rockafeller Skank" com a manjada "Satisfaction", do Rolling Stones.
O crescimento dessa nova cena pode ser medido pelo sucesso da "King of the Boots", noite gratuita londrina dedicada exclusivamente aos "bastard pop".
A atmosfera do lugar está sendo comparada à "Heavenly Social", histórica residência do Chemical Brothers no porão de um pub londrino em 1994. Na época, antes de seu sucesso, a dupla arrastava descolados intercalando músicas de rockers como Oasis com batidas de tecno e big beat. Foi ali que grande parte da cultura dance da cidade tomou forma. Além de Hellraiser, a "King of the Boots" é promovida por Osymyso (leia texto abaixo) e pelo Cartel Communique, os três nomes mais conhecidos no meio "bootleg".
Cartel Communique é uma dupla de adolescentes "anarquistas e psicopatas musicais" que, não contente com mixes de áudio, faz colagens com imagens.
Uma de suas "vítimas" foi a emissora britânica BBC, que teve um de seus vídeos misturado a uma animação e distribuído pela internet. "O que fazemos é uma reação às produções excessivamente rebuscadas que se encontram por aí. O sampler tem grande influência na cultura musical e ainda é bem pouco utilizado em vídeo. Queremos mudar isso", afirma Jonny Dixon, do Cartel.
"Para fazer um "bootleg", basta um equipamento básico, um software de edição musical e pronto. É a própria ética punk: qualquer um pode fazer isso", diz Dixon.



Texto Anterior: Pirataria terá nova campanha
Próximo Texto: Projeto une 101 músicas em uma
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.