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COMIDA
Patinhos feios da feira
Ignoradas nas mesas das grandes cidades, hortaliças como o jiló, o quiabo, o chuchu, o maxixe e a beterraba são recuperadas por chefs de restaurantes gastronômicos
RACHEL BOTELHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A não ser que você tenha
crescido em uma fazenda ou
passado longas férias no sítio
de avós ou outros parentes, é
improvável que ingredientes
considerados pouco nobres como o jiló, o quiabo, o chuchu, o
maxixe e até mesmo a beterraba façam parte de sua dieta.
Por desconhecimento ou um
bocado de preconceito, o fato é
que hortaliças cultivadas há séculos no interior do Brasil são
ignoradas nas mesas das grandes cidades.
"A cada dia, o contato com as
coisas populares e alimentos
desprezados diminui mais.
Eles ficaram muito restritos à
gastronomia mais elaborada",
afirma Mara Salles. A chef do
Tordesilhas se refere a um fenômeno crescente, do qual orgulhosamente faz parte: o resgate em restaurantes gastronômicos de ingredientes que são
não apenas nutritivos, mas estão intimamente ligados à cultura alimentar do brasileiro.
Seja no cardápio de seu restaurante ou no concorrido bufê
dos domingos, não faltam receitas como salada fria de chuchu com ovos, chips crocantes
de jiló e torta de maxixe com
queijo de cabra. "As pessoas,
principalmente as crianças,
torcem o nariz. Quem cultiva
esses hábitos são as pessoas
mais de antigamente", conta.
Para Maurício Lopes, professor do curso de gastronomia da
Universidade Anhembi Morumbi, o que dificulta a apreciação mais ampla desses ingredientes é o desconhecimento quanto ao preparo. "O problema é a falta de domínio do
método de cocção, que tem de
ser rápido para não perder sabor, textura nem nutrientes."
Segundo ele, é preciso observar certas peculiaridades para
extrair o melhor de cada hortaliça. "O jiló precisa estar meio
verde para ficar gostoso. Pode
ser frito, cozido etc. O maxixe é
uma delícia e aparece na cozinha brasileira em tortas elaboradas, caldinhos, gratinado. O
chuchu é muito parecido. Falam que não tem gosto, mas
bem colhido e trabalhado é saboroso e combina bem com camarão e molhos franceses."
Encanto do quiabo
No Rio também há chefs dispostos a transformar ingredientes aparentemente banais
em iguarias. Roberta Sudbrack,
que comanda o restaurante homônimo, prepara quiabo defumado com camarão e uma beterraba em caramelo que é praticamente uma sobremesa,
além de emprestar nova cara ao
clássico camarão com chuchu
cantado por Carmen Miranda.
Após uma viagem a Minas
Gerais no início do ano, onde a
hortaliça é muito apreciada,
Sudbrack dedicou elogios rasgados ao quiabo em seu blog
(www.egogourmet_roberta.globolog.com.br).
"Estou realmente encantada
com as possibilidades desse ingrediente, suas nuances, sua
sensualidade (...) Textura crocante, sabor mais para o amargo do que para o doce, levemente insinuante...", escreveu.
Tão repudiado por sua "baba" viscosa, o quiabo -quem
diria- virou a vedete de seu
menu-degustação atual. A chef
pretende estudá-lo ao longo
deste ano para tentar descobrir
novas maneiras de prepará-lo.
"É uma missão de dignificar
mais esse ingrediente, e tem de
ser corajoso para fazer isso. Minha equipe já está preparada
para ouvir pessoas dizerem que
não comem quiabo e tentar
convencê-las a experimentar."
Uma das possibilidades que a
chef já aprovou é o quiabo defumado. Em uma grelha de ferro
bem quente, coloca o quiabo inteiro até tomar cor em todos os
lados. Depois, rega-o com azeite, aos poucos, formando uma
fumaça que transmite a sensação de defumado. "Não fica nenhum vestígio de baba e depois
pode ser servido como quiser",
afirma. Outra idéia é caramelizá-lo inteiro em uma panela de
barro, ferro ou pedra-sabão,
usando manteiga e azeite.
Mas, entre todos os patinhos
feios da culinária, nenhum desperta tanta repulsa quanto o jiló. Raramente encontrado em
restaurantes paulistanos, ele
aparece em versão picante na
cantina Pasquale, ao lado de
outros antepastos. Temperado
com vinagre aromatizado em
pimenta-de-cheiro, é descascado, escaldado e servido em quatro gomos. "Não é dos mais pedidos, mas quem gosta muito
de pimenta e interessados em
cozinha brasileira não perdem.
O Alex Atala amou", afirma
Giorgio Nigro, filho e braço-direito do proprietário da casa.
Para Nigro, o jiló é como o
alho: desperta amor e ódio.
"Tem gente que nunca comeu e
odeia porque é amargo, principalmente quando refogado,
que é a maneira mais tradicional de servi-lo."
PASQUALE
Onde: r. Amália de Noronha, 167, Sumaré, tel. 0/xx/11/3081-0333
ROBERTA SUDBRACK
Onde: r. Lineu de Paula Machado, 916,
Jardim Botânico, Rio de Janeiro, tel.
0/xx/21/3874-0139
TORDESILHAS
Onde: r. Bela Cintra, 465, Consolação,
tel. 0/xx/11/3107-7444
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