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LIVROS/LANÇAMENTOS
Ameaça de sem-teto
vira mote literário
RODOLFO LUCENA
Editor de Informática
Diz a lenda da profissão que cada
jornalista tem um livro na cabeça,
sonha com o romance de sucesso,
que vira filme e muito dinheiro.
Peter Blauner chegou lá.
Nova-iorquino de 37 anos, é casado com uma repórter da CNN.
Ex-jornalista, hoje escritor de sucesso, acaba de vender para o cinema os direitos de seu último livro,
"O Intruso", que está chegando
às livrarias brasileiras.
Nesta entrevista concedida na
quarta-feira, por telefone, de Nova
York, Blauner fala sobre seu processo de trabalho e a relação entre
literatura e cinema.
Folha - Quando e como o sr. resolveu ser escritor?
Peter Blauner - Sou de Nova
York, cresci aqui e sempre quis escrever sobre a vida real, o estado
das coisas em Nova York.
Quando saí da faculdade, decidi
trabalhar como jornalista para ganhar a vida, mas principalmente
para conhecer a vida de outras
pessoas, não ficar escrevendo e
reescrevendo a minha própria biografia, como muitos escritores fazem.
Trabalhei na "New York Magazine" por dez anos, mas a idéia
sempre foi colher material e desenvolver minha capacidade de escrever. Até que chegou um ponto
em que pensei: "Ou você salta fora
agora e vai escrever, ou segue em
frente e, quando chegar aos 50, vai
olhar para trás e pensar que devia
ter caído fora quando era tempo".
Folha - Quando foi isso?
Blauner - Eu tinha 28 anos.
Meu primeiro livro foi sobre um
agente da condicional de NY,
"Slow Motion Riot" (que ganhou
o Prêmio Edgar de melhor novela
de estréia, espécie de Oscar para a
literatura policial e de suspense).
Como jornalista, eu estava fazendo uma reportagem sobre a situação de agentes da condicional,
e aquilo me pareceu ter um bom
apelo para uma história. Então, saí
da revista e trabalhei como voluntário no Departamento de Condicional por seis meses.
Depois, escrevi "The Cassino
Moon", sobre a máfia do jogo.
Procuro escrever sobre pessoas
que vivem à margem da sociedade,
onde acho que está o verdadeiro
drama. Elas só têm duas opções:
trabalhar como desgraçadas para
tentar voltar à sociedade ou criar
um mundo marginal, como as que
vivem nos subterrâneos de NY.
Folha - Esses miseráveis ganham
o primeiro plano em "O Intruso".
Como surgiu a idéia para o livro?
Blauner - Eu estava passeando
com meu filho em Manhattan,
quando passei pela H & H Bagels,
uma loja de bagels (pãozinho judaico) na esquina da Broadway
com a 80. Empurrava o carrinho
de bebê quando um sem-teto pula
na minha frente, arma um soco e
começa a berrar: "Pode chamar a
polícia, eu vou te matar!"
Ia me defender, já estava pronto
para agredir o sujeito, mas pensei:
"Espera aí, estou com meu filho,
isso é ridículo, vou sair daqui".
Saí, não aconteceu nada. Mas fiquei pensando que aquilo poderia
ser material para uma história: a
resposta das pessoas de classe média à violência nas ruas.
Comecei a escrever e achei que o
personagem, o advogado, era
muito quadrado, a história estava
meio fora de foco. Resolvi dar
mais importância para o sem-teto,
acho que ele é o principal personagem.
Folha - Na pesquisa para o livro,
o sr. foi trabalhar em um abrigo
para sem-teto.
Blauner - Trabalhei por um
ano, mais ou menos. Para ter essa
experiência, para entender como
pensam essas pessoas, ver como é
sair de um mundo para outro. Você vive em uma casa, tem trabalho
e, de repente, fica sem emprego,
sem casa, na rua -o processo psicológico é interessante.
Folha - Nessa pesquisa, enfrentou algum tipo de problema?
Blauner - No abrigo, não. Mas
tive nas pesquisas de rua, quando
fui ver como viviam as pessoas que
moravam nos subterrâneos. Um
deles pulou na minha frente e perguntou: "Você perdeu alguma
coisa aqui? Então, te manda". E
começou a jogar coisas em mim.
Minha sorte é que ele não tinha
boa pontaria. Terminei o trabalho
mais cedo naquele dia.
Folha - O sr. já vendeu os direitos
do livro para o cinema. Não teme o
que pode acontecer? Um trabalho
que lembra o seu, "A Fogueira das
Vaidades", é um bom livro que resultou em um filme ruim.
Blauner - Talvez um dos piores
filmes de todos os tempos. Eu desejo sorte para os produtores do
filme. Para mim, livros são livros e
filmes, filmes. O livro é minha responsabilidade. Se você gostar, me
cumprimente. Se não, soque meu
nariz. Eu respondo por ele.
Folha - Então, não há envolvimento seu no projeto?
Blauner - É, eu acho que eles
gostariam que eu mantivesse uma
distância respeitável do trabalho
deles.
Folha - Com seus livros e a venda
dos direitos para o cinema, já deu
para enriquecer?
Blauner - Posso viver como um
escritor e fico satisfeito com isso.
Eu tenho sorte. Muitos escritores
melhores que eu nunca conseguiram chegar a esse ponto.
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