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MÚSICA
No quarto disco solo, cantor reúne sambistas e rappers e ataca ex-parceiros
Marcelo D2 usa o samba para aprofundar o rap
ADRIANA FERREIRA SILVA
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
Já não é só a defesa da mistura
do rap com samba que preocupa
Marcelo D2, 38. Em seu novo disco, "Meu Samba É Assim", ele utiliza o estilo que lhe rendeu milhares de cópias vendidas de seus
dois últimos álbuns, "À Procura
da Batida Perfeita" e "Acústico
MTV", para peitar ex-companheiros que o criticaram e, assim,
fez um disco mais rap do que
nunca.
Em entrevista à Folha, D2 falou
sobre o novo trabalho, o que pensa do rap brasileiro e desceu a lenha em ex-parceiros.
Folha - Apesar do título, esse é
seu CD mais rap, não é?
Marcelo D2 - Também acho, por
isso chamei de "Meu Samba É Assim". Mas, ao mesmo tempo, é o
que fui mais fundo no samba: botei escola de samba, vozes de sambistas, a Alcione, o Zeca [Pagodinho] e o Arlindo [Cruz] e usei temáticas do samba nas letras.
Folha - Há mais jazz também?
D2 - Esse trio, Felipe Baden [piano], Maurinho [baixo] e Lourenço [bateria], que toca na minha
banda é totalmente jazzista. Temos feito jazz pra caramba.
Quando falo em samba, é de uma
maneira geral. Falo de samba-jazz, bossa nova, samba-rock.
Folha - De onde vem o lado rap?
D2 - Colocamos os beats lá na
frente. Falava para o [produtor]
Mario [Caldato]: "O bumbo tem
de ser como um soco e a caixa, como um tapa. Isso é mix de disco
de rap: bumbo, caixa e voz lá na
frente e o resto um pouco atrás.
Folha - Interferiu na produção?
D2 - Sou co-produtor de todos
os discos. Aprendi muito com o
Mario nestes nove anos que a gente trabalha junto. No rap brasileiro pode haver bons produtores,
mas melhor que eu não tem.
Folha - O CD tem o rapper Chali
Tuna e o DJ Cut Chemist, do Jurassic 5. Como rolou a participação?
D2 - Quando começou essa onda
de rap underground na América,
estava indo para lá lançar meu
primeiro disco, que tem essa cara
de underground por causa disso.
É a galera que me inspira.
Folha - Por que escolheu "O Gueto", a faixa mais rock, para estrear
nas rádios?
D2 - Dentro do contexto pop
rock das rádios hoje, ela é a que
mais se encaixa. Também gosto
da letra, acho que é a melhor do
disco. O primeiro single nunca é o
mais forte, e esse é um CD que
quero trabalhar muito tempo.
Dois anos, no mínimo.
Folha - Seus CDs venderam 125
mil e 160 mil cópias. Foi surpresa?
D2 - Não esperava que fizesse
tanto sucesso. Na época, estava
voltando de Los Angeles, ouvindo
"À Procura...", e pensei: "Onde
vai tocar esse disco? Não vai ser
em rádio de samba nem de rock.
Rádio de rap não existe".
Folha - Por que que estourou?
D2 - Vários fatores: o rap americano cresceu muito no Brasil e isso deu uma ajuda. Começaram a
tocar Eminem e Marcelo D2, Jay-Z e Marcelo D2. E teve um momento de orgulho nacional, de
"opa, temos nosso rap com samba: Marcelo D2". Além de tudo,
foi novidade. Podia muito bem ter
feito um pop rock, mas não. Fiz
essa parada e acabou dando certo.
Folha - Misturar rap com samba
não pode se tornar uma fórmula?
D2 - Não acho que seja uma fórmula inesgotável. Se todo mundo
começar a fazer, a vender refrigerante e sanduíche, vou para outro
lugar. Não tenho medo de mudar.
Fazer só samba. Ou só rap. Na
verdade, faço rap. Racionais
[MCs] não sampleia funk? Eu
sampleio samba.
Folha - Em 2000, você disse que
não iria ao Faustão, mas depois
acabou indo lá, na loja Daslu...
D2 - Nunca iria ao Faustão com
um trabalho como o Planet
Hemp. Mas, com "À Procura...",
vi um horizonte para ir porque estava a fim de que as pessoas ouvissem uma música nova. Se não fosse por esse caminho, o disco ficaria num marasmo. Tento manter
uma coerência. Não quero ser um
cara que faz qualquer parada.
Folha - Você foi criticado, não?
D2 - Não é fácil fazer sucesso.
Todo mundo começa a te criticar,
dizer que você está vendido. Que
tem dinheiro, mudou. Lógico que
mudei, fui para uma casinha melhor. Todos cobram muito, mas
não é qualquer um que tem coragem de ir ao Faustão, cantar e se
manter autêntico. Está na hora de
o rap se assumir como música
brasileira, como arte. Minha intenção é fazer arte para a massa.
Folha - E o rap nacional?
D2 - Anda a passos de tartaruga.
Ninguém faz nada. Parece que
tem uma cartilha: para ser rapper
você tem que olhar de cara feia,
não falar com a imprensa, xingar
o sistema. Por quê, cara?
Folha - Quando o Planet Hemp
voltou, em 2000, vocês disseram
que lançariam mais dois discos.
Não vai rolar?
D2 - Já era. Tenho vontade, mas
agora não rola mais.
Folha - Por quê?
D2 - Hoje, principalmente, porque os caras começaram a falar
merda do Planet Hemp. Como é
que o BNegão e o Black Alien falam mal do Planet? Se não fosse a
banda, esses caras não seriam nada. Eu me orgulho disso, por que
eles não se orgulham? Acho que o
Planet e a galera que gostava da
banda merecem mais respeito.
Folha - Está chateado com eles?
D2 - Estou magoado. O BNegão
vivia nas minhas costas e agora
vai numa revista falar que sou capitalista. Agora vive nas costas do
Falcão, é backing vocal do Rappa.
Assume logo que é backing vocal
e deixa o Planet Hemp.
A jornalista Adriana Ferreira Silva viajou a convite da gravadora Sony BMG
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