São Paulo, sexta-feira, 08 de junho de 2001

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"AMOR EM FUGA"

Cópia restaurada de longa de 1978 finaliza série dedicada ao alter ego do diretor François Truffaut

Episódio é digno fecho das aventuras de Doinel

CRÍTICO DA FOLHA

"Amor em Fuga", episódio que fecha a série dedicada a Antoine Doinel, pode ser descrito como uma sequência de variações em torno dos mesmos temas: o amor, as mulheres, a família.
Pela primeira vez, no entanto, François Truffaut faz uma meditação sobre a própria criação: o que existe de autobiográfico e de fictício em sua criatura, porque alguns episódios devem falsear a verdade para produzir o equilíbrio entre os personagens.
Pela primeira vez, também, retoma os episódios anteriores como a sugerir um novo estágio na vida de Doinel: aos 35 anos, ele já tem um tempo a reencontrar.
O filme, no mais, é feito de alguns reencontros. Com Colette, garota que lhe dá o fora no primeiro episódio, com o amante de sua mãe, com a ex-mulher. É como se, através dos encontros, Truffaut se perguntasse sobre o mistério dos destinos, das coincidências que nos levam para tal ou tal parte e fazem dele o que é.
Talvez seja só uma maneira gentil de dizer que, a essa altura, Antoine já era um personagem esgotado. Se no início havia a amarga revolta e mais tarde uma alegre perplexidade, o fato é que o personagem tirava seu encanto da permanente descoberta da vida.
Desta vez, seu romance com a jovem Sabine não traz um conteúdo novo. Antoine já passou pela busca da mãe, pela fascinação dos primeiros amores, pelo casamento e pela separação. Que lhe resta, então? Recomeçar. Na vida é isso o que acontece. Na arte, o cansaço tende a se impor.
É esse perigo que Truffaut consegue driblar com astúcia, impondo o diálogo com o passado de Antoine como enquete sobre o desenvolvimento do próprio personagem e da própria ficção.
Assim, este filme, recebido com certa reserva a seu tempo, revela-se um digno fecho dessa série curiosa, em que a comédia não raro rola solta, mas sempre deixa a suspeita de que algo ainda está por se dizer e que vai contrariar profundamente sua leveza.
Truffaut a encerra sem abdicar da leveza e do equilíbrio como características essenciais de um personagem que parece ser seu próprio borrador, na medida em que vivencia profundamente a instabilidade das coisas e a própria instabilidade. (INÁCIO ARAUJO)


Amor em Fuga
L'Amour en Fuite
   
Direção: François Truffaut
Produção: França, 1978
Com: Jean-Pierre Léaud, Claude Jade
Quando: a partir de hoje no Top Cine




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