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Crítica/"Morango e Chocolate"
Filme de amor cubano vai além da limitação panfletária
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Filme político é um gênero que costuma provocar reações alérgicas na
maioria dos freqüentadores de
locadoras, quase sempre em
busca de entretenimento sem
conseqüências. Mas passar ao
largo de "Morango e Chocolate" seria menosprezar a riqueza
de sentidos possíveis para a palavra "política".
O filme cubano, dirigido por
Tomás Gutiérrez Alea e Juan
Carlos Tabió, em 1994, vai além
de qualquer limitação panfletária. O engajamento aqui diz respeito a um valor crucial -liberdade- pelo qual todos lutam.
A obra narra primeiro uma
tentativa fracassada de sedução, depois, o envolvimento de
um homossexual culto -duas
características suficientes para
se tornar um perseguido pelo
regime de Fidel Castro- e um
jovem entusiasta dos valores da
revolução cubana. De um lado,
a consciência libertária; de outro, a paixão cega como sinônimo de ideologia. De um lado, o
desejo livre de amarras; de outro, o preconceito.
Como já indica o título, não
interessa à dupla Alea/Tabió
reduzir a um simplismo a oposição entre caracteres estereotipados, nem conduzir o espectador a assumir um dos partidos. Não existe a opção de escolher o sabor morango (o da delicadeza do homossexual Diego)
ou o chocolate (o da macheza
do heterossexual David). Trata-se de fazer ver, por meio de
um relacionamento calcado na
oposição e na disputa, que a exclusão da diferença é o caminho mais curto para a supressão do humano.
Quando se aponta o elemento político na obra não se quer
dizer que se trata de um filme
de propaganda. Com uma abordagem quase romântica de
ideais libertários, Alea e Tabió
permitem ao público identificar valores concretos da revolução como superados àquela
altura. Mas nem por isso a obra
funda suas qualidades em um
posicionamento anticastrista.
Rever "Morango e Chocolate", passada mais de uma década, permite compreender que,
mais que um filme político,
Alea e Tabió realizaram um belíssimo filme de amor. Do amor
entre dois homens que avançam sobre suas diferenças e
concretizam sua bela história
com base no entendimento. Do
amor por Havana, filmada com
uma única poesia capaz de revelar mesmo suas ruínas e seu
folclore sob a luz da exuberância. Por fim, do amor a um país
e a uma cultura, na devoção que
Diego dispensa para elevar David à altura onde se encontram
os deuses da arte cubana.
MORANGO E CHOCOLATE
Direção: Tomás Gutiérrez Alea e Juan
Carlos Tabió
Distribuidora: Versátil (R$ 37,50)
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