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Em livro, Pamuk constrói alegoria entre leste e oeste
Em "O Castelo Branco", de 1985, que sai agora no Brasil, autor confronta Oriente e Ocidente com personagens idênticos
Pamuk aponta referências a Borges e Allan Poe em seu romance; próximo livro, "Museum of Innocence", sairá na Feira de Frankfurt 2008
EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL
Em 1985, então com 33 anos,
o escritor turco Orhan Pamuk
ainda não havia alcançado notoriedade internacional quando lançou "O Castelo Branco",
que sai agora no Brasil. Nele,
Pamuk fez uma alegoria da relação entre Oriente e Ocidente,
tema que marca quase toda sua
obra, através de um recurso caro à literatura mundial: a figura
do "Doppelgänger", o "duplo".
No romance, Pamuk retoma
um personagem de seu segundo livro, "A Casa Silenciosa", o
acadêmico Faruk Darvinoglu,
que, num prefácio, revela ter
achado um manuscrito do século 17. O texto narra a história
de um jovem italiano aprisionado por uma esquadra turca,
levado a Istambul e feito escravo de um turco idêntico a ele.
Os personagens passam a
trocar seus conhecimentos e
visões de mundo ao ponto de o
italiano se "orientalizar" e de o
turco se "ocidentalizar".
"O livro foi minha contribuição ao gênero, sendo que utilizo, de forma alegórica, o Ocidente e o Oriente como "duplos'", diz Pamuk à Folha,
apontando aí referências a autores como Jorge Luís Borges
(especificamente o conto "A
História do Guerreiro e da Cativa", de "O Aleph"), e Edgar
Allan Poe ("William Wilson").
Pamuk, no entanto, ressalta
que o livro não se limita à metáfora da relação "leste-oeste".
"Afora os elementos simbólicos, trata-se da história de dois
indivíduos solitários que tentam se descobrir ensinando,
um ao outro, tudo que sabem."
Periferia
Orhan Pamuk esteve no Brasil em 2005, quando participou
da Festa Literária Internacional de Paraty. Da literatura brasileira, conhecia obras de Clarice Lispector e de Machado de
Assis, a quem considera bastante moderno e experimental
para seu tempo. De sua passagem pelo país, lembra-se das
andanças no Rio, que compara
a Istambul. Além dos "contrastes entre a ruína e o moderno",
ambas teriam a mesma qualidade melancólica de quem vive
na periferia do Ocidente.
Em 2006, Pamuk recebeu o
Nobel de Literatura, tido como
indicação da intelligentsia européia de apoio político ao escritor, que no ano anterior havia sido acusado pela Turquia
de ofender a nação. Pamuk havia dito a um jornal que seu país
fora responsável pelo genocídio de armênios e curdos.
O escritor, que viu o alcance
de sua obra aumentar após o
Nobel -segundo ele mesmo, de
um número relativamente pequeno de traduções para mais
de 50- lamenta que todo o episódio tenha feito com que jornalistas do mundo todo o vejam
mais como uma figura política
do que um autor de ficção -o
ofício que reitera e descreve em
discursos como o que fez ao receber o Nobel, presente em "A
Maleta do Meu Pai", também
lançado agora no país.
Pamuk não se esquiva, no entanto, de comentar as ameaças
da Turquia de invadir o norte
do Iraque em retaliação aos
ataques da guerrilha do Partido
dos Trabalhadores do Curdistão. "Tenho a esperança de que
tudo se resolva pelos caminhos
diplomáticos", diz.
Temas como política e guerra
não devem sair da agenda de
Pamuk tão cedo, no entanto.
Vencedor do prêmio da Paz na
Feira de Frankfurt em 2005,
antes mesmo de receber o Nobel, o escritor voltará à cidade
em 2008, quando o evento homenageia a literatura turca. Pamuk, que lançará na Alemanha
seu novo romance, "Museum of
Innoncence" (museu da inocência), espera que a feira coloque em debate questões como a
censura e a conflituosa relação
de seu país com os curdos.
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