São Paulo, sexta-feira, 08 de dezembro de 2000

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CRÍTICA

Zeca torna-se necessário

EDUARDO GUDIN
ESPECIAL PARA A FOLHA

Zeca Pagodinho sempre teve um estilo peculiar.
É o João Gilberto do samba, dizem alguns. Divisões precisas e originais, voz tranquila, cheia de suingue, bom compositor etc.
Depois deste álbum, "Água da Minha Sede", Pagodinho passa a um patamar acima. Torna-se necessário. Absolutamente necessário.
É fácil explicar. Ele poderia trilhar o caminho mais tentador, gravando sambas cada vez mais comerciais, caminhando em direção à fronteira sutil que separa o seu bom samba de um samba comercialóide, pois o samba de Zeca Pagodinho é festa, é pagode da antiga, o que poderia permitir alguns escorregões quase imperceptíveis.
Ao contrário, Pagodinho envereda por uma sofisticação que nos remete, por exemplo, a Clara Nunes.
Os versos de Aldir Blanc, em música de Moacir Luz, chamam Pagodinho de "Anjo da Velha Guarda". Apelido justo, mais do que justo.
A primeira faixa, que dá título ao disco, já é um samba baiano (estilo), de Dudu Nobre e Roque Ferreira, com uma complexa levada rítmica em contraponto com o canto, com divisões livres e de bom gosto.
E, nesse garimpo, Zeca traz Monarco da Velha Guarda da Portela). Traz também Elton Medeiros e conversa com ele num comovente diálogo no fim da música em parceria com Paulo César Pinheiro.
Tem Sinhô e Nei Lopes. E por aí vai. Tem também um samba incrível, da antiga: "Delegado Chico Palha".
E a rapaziada de sempre: Almir Guineto, Beto sem Braço, Luiz Carlos da Vila, Wilson das Neves e outros da mesma estirpe.
A importância de Zeca Pagodinho é percebida por mim também de forma particular. Ele me devolve, com esse trabalho, uma sensação boa, antiga, que estava adormecida.
É a vontade simples, que todo compositor merece ter: mandar uma música nova para um cantor, esperando que a qualidade seja determinante para que essa música seja gravada.
A maioria dos arranjos e a produção são do excelente Rildo Hora. Rildo fez escola na maneira de mixar discos de samba.
Elifas Andreato mais uma vez acertou na capa.
Zeca, "Anjo da Velha Guarda" e da nova. Absolutamente necessário.

Eduardo Gudin é compositor, arranjador e violonista

Água da Minha Sede
    
Artista: Zeca Pagodinho
Lançamento: Universal
Quanto: R$ 20, em média




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