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Foco
Platéia gritou "Meeengo!" no refrão de "Everything She Does Is Magic", em 1982
RUY CASTRO
COLUNISTA DA FOLHA
O show do Police no Maracanãzinho em 1982 já compete com o primeiro treino
de Garrincha no Botafogo
em 1953 e com o jogo Brasil x
Uruguai, na final da Copa do
Mundo de 1950, no Maracanã, em matéria de evento a
que, a posteriori, todo mundo assistiu.
O caso do treino de estréia
de Garrincha, então, é um espetáculo: um incrível sexto
sentido fez com que milhares de botafoguenses, vivos e
mortos, fossem ao campinho
da rua General Severiano
num dia de treino no meio da
semana e vissem os primeiros dribles daquele jogador
solidamente desconhecido
que chegara ao clube, vindo
da roça, meia hora antes.
E o público oficial de Brasil x Uruguai, estimado em
250 mil pessoas -espremendo-se de pé ou umas
empoleiradas nas outras-
terá de subir para mais de 1
milhão se se contar todo
mundo que disse que estava
lá. Acho até que, por usar na
época fraldas ou calças curtas, sou a única pessoa de minhas relações que não compareceu à final da Copa de 50
ou ao primeiro treino de
Garrincha.
Em compensação, assisti
ao show do Police no Maracanãzinho, no dia 16 de fevereiro de 1982, uma terça-feira, às vésperas do Carnaval.
E, por ter estado lá naquele
dia, lembro-me de passagens
que, misteriosamente, não
ficaram na memória de ninguém que hoje me fala emocionado do show.
A primeira foi a do sujeito
no balcão que, em meio a
"Roxanne", "Walking on the
Moon" ou algum outro número do trio, pendurou-se
numa corda que pendia do
teto do ginásio e sobrevoou a
platéia que nem Tarzan no
cipó, até ser abotoado pela
polícia numa das vezes em
que se aproximou do balcão.
A polícia, é claro, foi vaiada.
Meia hora depois, quando
ninguém mais se lembrava
dele, o sujeito reapareceu e
repetiu a façanha, até ser novamente abotoado e, dessa
vez, sumir para sempre.
O outro episódio se deu no
final de "Everything She
Does Is Magic", em que
Sting, Andy Summers e Stewart Copeland faziam um
vocalese composto de "yo" e
"yeah", que soava exatamente como o refrão de "Meeengo!" cantado pela torcida rubro-negra no Maracanã.
Ocorre que, menos de dois
meses antes, o Flamengo tinha sido campeão mundial
de clubes em Tóquio -e a
platéia do Maracanãzinho,
maciçamente flamengo, não
perdoou: adaptou o vocalese
ao seu canto de guerra. No
bis, do qual "Everything She
Does Is Magic" fez parte,
Sting, muito vivo, já puxou
ele mesmo o grito de
"Meeengo!" na hora do vocalese. Foi a sua consagração.
Se tanta gente alega ter assistido ao Police no Maracanãzinho, como se explica que
o ginásio estivesse pela metade? E que eu próprio, dispondo de dois ingressos, não
tenha encontrado ninguém a
fim de ir comigo?
O Police era então quase
secreto no Brasil -dele, as
rádios tocavam o gugu-dadá
"De Do Do Do, De Da Da Da"
e mais nada. Só os mais atentos conheciam "Message in a
Bottle", "Don't Stand so Close to Me", "Can't Stand Losing You", "Demolition
Man" ou "Spirits in the Material World". Mas os que já
tinham se encantado pelo
jazz-reggae do conjunto sabiam que sua qualidade musical estava acima dos dois
acordes habituais do rock.
Talvez uma multidão tenha mesmo assistido ao Police no Rio em 1982. Mas só se
foi no show do dia seguinte,
17 de fevereiro. Nesse dia, no
entanto, alguém gritou evoé
e meu coração se transformou num tamborim.
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