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Livros - Crítica/"Globalização, Democracia e Terrorismo"
Hobsbawm discute democracia e globalização no século 21
Historiador aborda hegemonia dos Estados Unidos no mundo pós-Guerra Fria
RÉGIS BONVICINO
ESPECIAL PARA A FOLHA
"Globalização, Democracia e Terrorismo" é coletânea de
dez ensaios curtos (2000 a
2006), nos quais o historiador
Eric Hobsbawm aborda as conseqüências da globalização,
que, para ele, trouxe "uma dramática acentuação das desigualdades econômicas e sociais
no interior das nações e entre
elas" e sua repercussão política
e cultural, em desproporção
-segundo ele- com sua "escala real modesta". Para analisá-la, faz um estudo comparativo,
ao longo dos textos, entre o século 20 e o 21 e examina o legado daquele para este, onde uma
única superpotência, a partir,
sobretudo, de George W. Bush,
intenta dominar, militarmente,
o mundo.
Hobsbawm não repete clichês, desmonta-os, quando
afirma que: "...isso ressalta a
fraqueza relativa e absoluta dos
movimentos terroristas da fase
atual. Eles são sintomas e não
agentes históricos significativos", remarcando que, por mais
horripilante que tenha sido o 11
de Setembro de 2001, o poder
internacional do país e suas estruturas internas não foram
afetadas em nada.
Sintomas, então, do quê? Do
esgotamento do Estado nacional e da subseqüente erosão de
seus sistemas jurídicos e, principalmente, internacionais, estes por terem perdido seu caráter imperativo, a ser seguido
por todos os Estados, em razão
do fim da Guerra Fria (extinção, em 1989, da União Soviética) e com a ruptura unilateral,
promovida pelos Estados Unidos, com a Guerra do Iraque. Os
temas do livro são tão abrangentes, que me limitarei a tatear apenas dois, o do nacionalismo e o da hegemonia norte-americana.
Novo equilíbrio
Para Hobsbawm, passou-se
do mundo nítido da Guerra
Fria, onde as duas superpotências (EUA e União Soviética)
respeitavam as fronteiras nacionais de aliados e adversários, em virtude do medo de
uma guerra nuclear, para uma
situação difusa, sem mediação
legislativa sólida, onde as empresas transnacionais privatizaram o direito internacional
público e, desde então, "as decisões sobre guerra e paz têm sido improvisadas", provocando
tensão permanente. Para ele,
"o equilíbrio entre a guerra e a
paz no século 21 dependerá
muito mais da estabilidade interna dos países e da capacidade de evitar os conflitos militares do que da construção de
mecanismos mais eficazes para
a negociação e solução de controvérsias".
Com isso, reafirma a falência
da ONU. Na trilha do esgotamento do Estado nacional, causado pela globalização econômica, toca num ponto decisivo
e, até aqui, pouco pensado: ela
não se dá no campo da política,
que permanece provinciana,
louvando-se de "democracias
eleitorais aritméticas", que
pouco representam o povo. Ou,
no dizer do cartunista El Roto,
do jornal espanhol "El País",
em uma vinheta acerca de políticos: "Globalización si... y pero
con muros". Esse desencontro
entre economia e política (provincial) leva Hobsbawm à descrença na construção de mecanismos internacionais que possam impedir, de modo efetivo, a
guerra, imediatamente.
Índole isolacionista
No ensaio "Por Que a Hegemonia dos Estados Unidos Difere da do Império Britânico", o
autor acaba por revelar a índole
isolacionista que está na origem e no presente daquele país.
Afirma: "A paz internacional
não é criação dos impérios, e
sim o que lhes dá chance de sobreviver".
Hobsbawm explica que os
Estados Unidos ergueram seu
império a partir do continente,
de uma revolução de independência, com o suporte, depois,
de Estados solícitos. E que a
Grã-Bretanha montou o seu,
nos séculos 18 e 19, lastreada
em bases marítimas em todo o
globo, reconhecendo, no entanto, suas limitações bélicas.
Aponta a diferença central: os
Estados Unidos definem ideologicamente os seus inimigos,
"aqueles que rejeitam o estilo
de vida americano, quem quer
que sejam", comunistas, traficantes ou islamistas. Concluindo que lá existe uma "democracia de negócios": "O que é bom
para o país, é bom para a General Motors", relembrando o lema dos anos 1950.
Portanto, em novembro deste ano, o povo estadunidense
decidirá -nas urnas, com seu
sentido plurívoco- se revigora
o dístico e a "megalomania inata" ou se opta pela reconstrução de uma nova ordem mundial pacífica, com respeito às
diferenças.
RÉGIS BONVICINO é poeta, autor, entre outros,
de "Página Órfã" (Martins Editora).
GLOBALIZAÇÃO, DEMOCRACIA E TERRORISMO
Autor: Eric Hobsbawm
Tradução: José Viegas Filho
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 36 (184 págs.)
Avaliação: ótimo
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