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Personagem ganha recorte feminista
Quantidade de efeitos dificultou trabalho dos atores e fez com que o "Alice" ficasse pronto só há duas semanas da estreia
Aliar um clássico da literatura a um diretor cultuado e ao apelo do 3D foi receita da Disney para obter explosão de bilheteria
DA ENVIADA A LONDRES
Pegue um clássico da literatura mundial de 150 anos. Empreste-o a um dos diretores
mais cultuados e esquisitos de
Hollywood. Empacote tudo
com o que há de mais novo em
tecnologia no cinema, o 3D.
A receita da Disney para recriar "Alice no País das Maravilhas" só não é tão previsível
porque o diretor em questão é
Tim Burton. Sua lente transcendeu a obra de Lewis Carroll
como numa viagem lisérgica,
fundindo dois livros num só filme: "Aventuras de Alice no País
das Maravilhas" (1865) e "Através do Espelho e o que Alice
Encontrou por Lá" (1872).
A obra de Carroll -codinome
adotado pelo reverendo e professor de matemática Charles
Lutwidge Dodgson- é uma das
mais famosas, citadas e traduzidas do mundo. A história foi
criada para uma garotinha de 11
anos, Alice Liddell, por quem
Carroll nutria carinho tão especial que chegou a levantar suspeitas de pedofilia.
Repleta de símbolos, a obra
moldou o imaginário cultural,
do surrealismo à psicodelia.
Para dar conta desse cânone
sem comprometer sua fama de
ousado, Burton optou por
transportar Alice para seus 19
anos. Com isso, deu à personagem recorte feminista: uma jovem sonhadora de espírito livre
enredada pela rigidez dos costumes da Inglaterra vitoriana.
O filme começa quando Alice
é pedida em casamento. Desconcertada, ela foge da resposta
correndo atrás do Coelho Branco, que viu no jardim. Na perseguição, cai no buraco que a leva
ao Mundo Subterrâneo ("Underland"), o mesmo que visitou
ainda criança, quando achou
que seu nome era País das Maravilhas ("Wonderland").
Ali, suas aventuras são uma
alegoria da busca por coragem e
identidade, que culminam numa batalha em que Alice encarna uma espécie de Joana D'Arc.
Burton investiu o papel principal na novata Mia Wasikowska, australiana que abandonou
o balé para se tornar atriz em
2006. Também se cercou de
sua patota: Johnny Depp, como
o Chapeleiro Maluco, e sua mulher, Helena Bonhan Carter,
com quem vive em Londres em
duas casas conjugadas (cada
um em uma delas, diga-se) e
tem dois filhos pequenos.
O grande desafio do elenco
de "Alice" foi um constante
exercício de imaginação no set.
Isso porque, para criar cenários
alucinantes e personagens animados em pós-produção, os
atores tinham de contracenar
com objetos inanimados, como
uma bola de tênis ou um naco
de fita adesiva, imersos em um
ambiente 100% verde, preenchido depois em computador.
"Não foi fácil. Aquele verde o
tempo todo começou a deixar a
equipe deprimida", confessou
Carter. "Tim passou a usar óculos de lentes azuis para aturar
um mundo monocromático."
A profusão de efeitos especiais fez com que o filme ficasse
pronto apenas duas semanas
antes de sua estreia. Tamanho
espetáculo para os olhos implica, no entanto, um risco crucial:
o de não falar tanto aos corações de quem os vê.
(FERNANDA MENA)
Leia a íntegra da
entrevista com Burton em
www.folha.com.br/ilustradanocinema
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