São Paulo, domingo, 09 de abril de 2006

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MÔNICA BERGAMO

João Sal/Folha Imagem
Em Ipanema, as candidatas se acotovelam por fotos com o cantor Felipe Dylon, que tentava passar despercebido pela praia


Candidatas a Miss Brasil driblam regras do confinamento, mentem sobre as medidas e escondem o histórico de cirurgias plásticas

As pequenas princesas

São 7h e cinco secadores funcionam a todo vapor num hotel da Barra da Tijuca, no Rio. Dos 27 Estados, ops!, mulheres, de biquíni e canga, as que já estão de cabelo seco e maquiagem feita ensaiam passos de funk. O gênero musical está longe de ser música de miss, mas é o preferido das candidatas ao Miss Brasil 2006 no "confinamento" de quase dez dias no Rio, antes do concurso.

 

As regras da concentração são como as dos jogos de futebol: parentes, ajudantes e namorados são proibidos no salão e nos dois andares em que se hospedam as misses. São duas candidatas por quarto, organizadas em ordem alfabética (Acre com Alagoas, Amapá com Amazonas). O tempo todo, as moças são acompanhadas por três "chaperonas" (damas de companhia) e seguranças.
 

Berenice Rocha é a prova de que é possível furar o sistema. Da porta, espia as candidatas. Não demora, dribla os seguranças e entra. "Sou mãe da Pará", diz, apontando para Nahdia. "Não podemos entrar. Eu marco hora escondida com ela no café para dar bom dia."
 

"Soube que Tocantins está passando mal! Foi Sergipe que disse." É Bertini Motta avisando Maria Helena Palhares, ambas chaperonas. "Tocantins" é Camila Oliveira, "Sergipe" é Aisley de Souza. "Nós sabemos os nomes delas, mas chamar pelo Estado facilita", diz Maria Helena. "Somos as mães delas nesses dias", completa Bertini.
 

Chaperona há 13 anos, Bertini justifica as regras: "Temos 81 problemas: 27 meninas que querem ser a Miss Brasil; 27 mães que acham que suas filhas vão ser a Miss Brasil e 27 coordenadores [dos concursos estaduais] que têm certeza de que a menina de seu Estado vai ser a Miss Brasil". As meninas são escolhidas em seus Estados por organizações ligadas ao concurso nacional.
 

Maquiagem e cabelos feitos, as misses vestem suas faixas e vão para a praia do Pepê, na Barra, onde gravam imagens para a Band. Ceará (Carla Rocha) toma sol vigiada pelo segurança. A maioria permanece de canga. Rafaela Zanella, 19 anos, miss Rio Grande do Sul, não.
 

Bronzeada "de sol e de bronzeamento artificial", Rafaela é a que teve mais tempo para se preparar. O concurso de seu Estado foi em outubro. "Meu coordenador [Evandro Hazzy] me colocou num hotel cinco estrelas em Porto Alegre." Ela faz do concurso". "Ah, elas não assumem! Algumas até mentem as medidas", revela a chaperona Maria Helena.
 

Na praia, Mato Grosso (Vanessa Regina de Jesus) se anima. "É a primeira vez que vejo o mar!" Só pode molhar os pés na água. "Não me deixam tomar banho, pra não estragar a maquiagem." Funcionária da Assembléia Legislativa de Cuiabá, Vanessa é de família simples. O pai dela era caseiro de uma fazenda e sofreu um acidente que o deixou paralítico. A mãe é servente de uma escola pública.
"Só pude vir porque o governo bancou as passagens."
 

Com o uniforme - vestido tomara-que-caia de malha rosa e sandália de salto alto prateada-, Vanessa corre atrás de um surfista na praia. É Felipe Dylon, que tenta passar despercebido no Arpoador, mas é flagrado pelas misses. Câmeras digitais nas mãos, todas querem fotos com o cantor.
 

"Ah, pensei que ele era mais alto", reclama Amapá (Patrícia Trindade), depois da foto. Ela está entre as mais "coroas": tem 22 anos -a média de idade é de 19 anos. "Tento ser miss Amapá desde os 17." Ex-vendedora de peixe e sacolé (raspadinha de gelo com sabor de fruta) em Macapá, Patrícia "não tinha dinheiro para comprar o sapato do desfile. Tive de ralar". Nesses cinco anos, juntou dinheiro e abriu uma pequena loja de moda aeróbica.
 

Bem diferente é o caso de Distrito Federal (Ana Cláudia Pimenta). Filha de uma assessora parlamentar do senador Paulo Octávio (PFL-DF) e do dono de uma clínica de cirurgia plástica, ela ganhou roupas e sapatos de estilistas de Brasília. "Lá, durante o concurso, fomos visitar o Senado. Eles pararam uma sessão da CPI pra cumprimentar as 18 candidatas. Tiramos até fotos com o ACM."
 

Apesar de ser de Santos, São Paulo (Nicole Bernardes) não foi eleita pela cidade, e sim por Taubaté. Depois de vencer o concurso estadual, além de ganhar um carro popular, Nicole, que é modelo da agência Mega -sim, modelos também querem ser Miss Brasil-, ela teve o cachê valorizado. "A agência agora pode me "vender" como miss. Até ganhei R$ 500 só pra ir a uma festa, acredita?"
 

Depois da praia, elas se preparam para um encontro inusitado. "Por que é que a gente tem de visitar essa Rosinha?", pergunta Distrito Federal, depois da segunda maquiagem do dia, no hotel.
 

Não precisou de resposta. O encontro com a governadora do Rio, Rosinha Matheus, foi desmarcado. O motivo: incompatibilidade de agendas. Elas voltam para a concentração e ensaiam a coreografia para o concurso, marcado para o último sábado, 8.
 

Já é noite quando a Miss Brasil 2005, Carina Beduschi, chega ao hotel para jantar com as meninas. A vitória no concurso do ano passado agitou sua vida, mas nada é para sempre: a partir desta semana, Carina deve retomar os estudos na faculdade de arquitetura, em Florianópolis, que tinha abandonado para cumprir, por um ano, a agenda de miss.

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