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ARTIGO
Comédias francesas chegam ao Brasil, mas não fazem rir
"Se Eu Fosse Você" francês estreia com dois anos de atraso em circuito de arte
e mostra por que razão os sucessos da terra de Godard quase não chegam aqui
ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL
Seja pelo imaginário que personalidades como Jean-Luc
Godard, 79, ou Alain Resnais,
87, ajudam a nutrir, seja pela
resistência histórica dos filmes
de autor, o cinema francês tende a ser tomado, entre nós, como um cinema genericamente
chamado "de arte".
Mas a coincidência da estreia
simultânea de duas comédias
produzidas nestes anos Sakorzy torna inevitável a constatação de que, lá, como aqui, a
receita do sucesso - se é que
receita há - foi escrita no avesso da cartilha exportada pela
nouvelle vague.
O cinema de autor pode ser o
que mais nos chega e o que
mantém a França nos principais festivais do mundo. Mas
são filmes como "A Riviera Não
É Aqui" e "Nos Tempos da Disco" que, de fato, apetecem à
massa do público.
Além do sucesso local e da estreia atrasada aqui, as produções têm em comum uma coreografia de cena próxima à TV
e um roteiro inofensivo, estruturado a partir de protagonistas de jeitão derrotado, apresentados de forma a tirar da
inadequação social sua graça.
Piada sem tradução
"A Riviera Não É Aqui" teve,
na França, o mesmo efeito que
"Se Eu Fosse Você 2" teve no
Brasil. O filme bateu recorde
atrás de recorde e, com 20 milhões de espectadores, contribuiu para que, em 2008, o cinema francês conquistasse 45,7%
do mercado interno. Foi "ulalá"
para todo lado.
A produção fez também com
que os analistas de mercado de
lá falassem o que, em 2009, falaram os daqui: o filme atraiu
um público que não pisava numa sala de cinema desde "Titanic". A diferença, em relação ao
Brasil, é que outro punhado de
filmes foi bem nos números.
Neste ano, cinco títulos nacionais fizeram mais de 2 milhões de espectadores - "Astérix nos Jogos Olímpicos" e
"Nos Tempos da Disco" entre
eles. O descompasso entre o cinema francês que os franceses
aplaudem e o cinema francês
que os brasileiros esperam fica
claro quando se descobre que
aqui, em 2008, o irresistível,
mas pequeno, "A Culpa É do Fidel" vendeu 130 mil ingressos
enquanto "Astérix" não chegou
nem nos 40 mil.
Raros são os sucessos locais
que viajam bem. Algumas das
exceções são "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain", de
Jean-Pierre Jeunet, e "A Marcha dos Pinguins", de Luc Jacquet, sucessos no mundo todo.
Os campeões de 2009 - outro ano de recordes para o cinema francês -, como a comédia
"Le Petit Nicolas" e a animação
"Artur e a Vingança de Maltazar", permanecem inéditos no
Brasil. E basta ver as duas comédias que estreiam hoje para
entender a razão.
A exemplo do que acontece
com as comédias brasileiras,
como "Se Eu Fosse Você" e "A
Mulher Invisível", as francesas
estão assentadas em tiques locais, jogos de palavras e especificidades sociais que, exportadas, no lugar de gargalhadas,
produzem, no máximo, um sorriso - às vezes, amarelo.
"A Riviera Não É Aqui" tem
um elenco primoroso e arma
simpáticos equívocos. Mas o fato de um funcionário dos correios ser transferido para o
norte, quando queria ir para a
Riviera, é bem menos engraçado para um brasileiro que para
um francês. Seria, mais ou menos, como querer que um estrangeiro morresse de rir com
piadinhas sobre paulistas ou
gaúchos. Há, porém, certa graça universal que o diretor e ator
Dany Boon domina.
O mesmo não se pode dizer
de "Nos Tempos da Disco", que
traz Gérard Depardieu na versão "vamos aí". O filme conta a
história de Didier Graindorge,
ou Didier Travolta, um quarentão que vive com a mãe e, para
participar de um concurso de
dança e tentar ganhar duas passagens para a Austrália, resolve
recompor o grupo Bee Kings.
Nada do que é óbvio - das canções à roupa - ficou de fora.
Dá para entender porque, em
2008, um grupo de cineastas
franceses entregou, ao ministro da Cultura, um manifesto
que apontava a "concentração e
a banalização" do cinema local.
NOS TEMPOS DA DISCO
Direção: Fabien Onteniente
Produção: França, 2008
Com: Franck Dubosc, Emmanuelle
Béart e Gerard Depardieu
Onde: Belas Artes
Classificação: 12 anos
Avaliação: ruim
A RIVIERA NÃO É AQUI
Direção: Dany Boon
Produção: França, 2008
Com: Kad Merad, Dany Boon e Zoé Félix
Onde: Cine Bombril, Frei Caneca Unibanco Arteplex e circuito
Classificação: 12 anos
Avaliação: regular
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