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CRÍTICA
Filme é depuração da obra do diretor
da Equipe de Articulistas
"Paixão Perdida" é uma síntese
do cinema de Walter Hugo Khouri. Não apenas porque ali estão, de
modo depurado, os temas e obsessões centrais do diretor, mas também porque esse filme, ao mesmo
tempo simples e complexo, concentra as principais virtudes e fraquezas estéticas de sua obra.
Os personagens masculinos de
Khouri -sobretudo o empresário
eternamente insatisfeito Marcelo
Rondi, seu alter ego numa porção
de filmes- parecem sempre oscilar entre uma inquietação vital,
que os empurra à aventura erótica,
e uma necessidade de repouso, ou
pelo menos de equilíbrio.
Em "Paixão Perdida", o impasse
existencial de Marcelo (Antonio
Fagundes) é espelhado, de forma
concentrada e invertida, no drama
de seu filho Marcelinho (Fausto
Carmona), paralisado e mudo desde que presenciou a morte da mãe,
num desastre de carro.
Para fugir da dor, o menino recusa a vida e aspira ao estado inanimado da pedra, que ele passa o dia
a contemplar. Para ele, a vida (numa chave psicanalítica: o desejo, o
sexo) identifica-se com o fogo que
consumiu sua mãe.
Marcelo, o pai, ao contrário, é todo potência e desejo de ação. Empreende, constrói, viaja, conquista
mulheres. O filho paralisado é, para ele, uma grande frustração e,
também, o lembrete remoto de sua
própria necessidade de repouso.
O ponto em que as trajetórias
opostas dos dois vão se encontrar é
a jovem enfermeira Anna (interpretada por Mylla Christie), que
evoca no garoto a mãe perdida e,
no pai, a paz que ele quer conciliar
com o desejo.
Há ainda três outras mulheres
importantes: a governanta Matilde
(Zezeh Barbosa), a filha mais velha
de Marcelo, Berenice (Andréa Dietrich), e a namorada do empresário, Ruth (Paula Burlamaqui).
Na superfície, é um drama psicológico banal. Mas a grandeza do
filme está em transcender, pela
forma, a leitura meramente psicanalítica.
Na encenação, na composição
dos quadros e em seu encadeamento, Khouri constrói um sutil
drama geométrico, em que vários
triângulos se sobrepõem e se substituem continuamente: Marcelinho-Anna-governanta; Marcelinho-pai-namorada do pai; Marcelo-filha-namorada; Marcelo-namorada-governanta; e, por fim,
Marcelo-Anna-Marcelinho.
Paira sobre esse movimento contínuo a imagem recorrente da mãe
morta -visão mítica e idealizada
da conciliação entre o desejo e a serenidade, o fogo e a pedra.
As trajetórias paralelas de Marcelinho e seu pai são caminhos diametralmente opostos para chegar
ao mesmo lugar, uma espécie de
iluminação zen: a superação do
impasse entre os impulsos de vida
e de morte, o fim do divórcio entre
o eu e o cosmo.
O que impede "Paixão Perdida"
de realizar plenamente sua promessa estética são o excesso de
diálogos inúteis e a interpretação
inadequada da maioria dos atores
(uma exceção é Fausto Carmona).
Se fechar os ouvidos aos diálogos
e viajar pelas imagens e pela bela
música (de Wilfred Khouri, filho
do diretor, e Ruriá Duprat, sobrinho de Rogério Duprat), o espectador fruirá um lindo filme.
(JGC)
Avaliação:
Filme: Paixão Perdida
Direção: Walter Hugo Khouri
Elenco: Antonio Fagundes, Mylla Christie,
Maitê Proença, Fausto Carmona
Onde: Espaço Unibanco, SP Market e Olido
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