CARLOS CALADO
especial para a Folha

O esperado reencontro do pianista carioca Egberto Gismonti com o baixista norte-americano Charlie Haden encerrou, já na madrugada de ontem, a primeira noite do Heineken Concerts 99.
Se alguém tentasse traduzi-la com uma pintura, a etérea noite de abertura do festival seria representada por uma paisagem em tons pastéis.
Menos explosivo do que em suas performances habituais, o pianista cubano Gonzalo Rubalcaba abriu o programa dedilhando uma delicada canção de ninar. Prosseguiu com uma seleção de baladas suaves e meditativas, incluindo a clássica "Here's that Rainy Day" (de Burke e Van Heusen).
A atmosfera romântica da exibição do cubano só foi quebrada por outro standard. "Caravan" (de Ellington, Tizol e Mills) surgiu numa versão mais vibrante, com uma breve insinuação de ritmo afro-cubano.
Atração principal da noite, o concerto do Quartet West foi um pouco prejudicado pela equalização sonora. Um rebatedor de acrílico, utilizado para proteger Charlie Haden (que sofre de hipersensibilidade auditiva), acabou comprometendo a unidade do quarteto.
Um solo esfuziante de Ernie Watts, durante o bebop "Dexterity", antecipou o que veio a acontecer nos números seguintes. O saxofonista foi o responsável pelos momentos mais brilhantes de um concerto que primou pela contenção.
Demonstrando estar no auge de sua forma criativa, Watts arrancou gritos da platéia, especialmente num longo improviso à capela que fechou "First Song" (de Haden). Uma verdadeira aula sobre como combinar emoção e técnica no jazz.
Quase escondido no fundo do palco, Haden só mostrou a que veio após a entrada de Gismonti. O duo precisou apenas de dois números para roubar a noite. A lírica "Palhaço" (de Gismonti) foi conduzida pelo pianista com muita delicadeza e inventividade nos improvisos. Depois veio a etérea "Silence" (de Haden), acariciada e ralentada pelo duo até o limite do silêncio. Fecho perfeito para uma noite em tons pastéis.

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