São Paulo, sexta-feira, 09 de agosto de 2002

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MÚSICA/LANÇAMENTOS

"PET SOUNDS LIVE"

Mentor dos Beach Boys tenta refazer o caminho do sucesso

Ao vivo, Brian Wilson se recusa a envelhecer e erra

DIEGO ASSIS
DA REDAÇÃO

Brian Wilson nunca escondeu: "Pet Sounds", lançado em maio de 66, era a tentativa dos Beach Boys de alcançar, pelo menos, o mesmo patamar de "Rubber Soul", gravado um ano antes pelos Beatles. Paul McCartney, por sua vez, retribui: "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band", de 67, considerado por muitos o melhor álbum de estúdio da música pop, foi concebido durante uma overdose de "Pet Sounds".
Sem entrar no mérito de quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha, os Beatles ou os Beach Boys, o fato é que as 13 faixas de "Pet Sounds" continuam sendo reverenciadas por músicos e produtores do mundo todo como uma obra-prima do pop. E, se alguém tem de levar o crédito por isso, seu nome é Brian Wilson.
Cansado de fazer turnês com a banda -que tinha ainda seus irmãos Carl e Dennis, além de Al Jardine e Mike Love-, resolveu afastar-se dos palcos já em 64, para assumir o posto de produtor e compositor, sabendo que estaria escrevendo seu testamento.
Tornou-se um mestre nessa área e, com raríssimas exceções, jamais voltou a se apresentar no conturbado período pós-"Pet Sounds", que viu o grupo descer da crista da onda, com singles e álbuns que não chegavam mais a disputar as primeiras posições nas paradas americanas, como acontecera com as canções "Surfin" USA", "I Get Along" e outros dos primeiros sucessos dos garotos da Califórnia.
Brigas internas com gravadoras, com os próprios integrantes e uma série de projetos frustrados depois, Brian Wilson resolveria voltar a fazer shows em 1999 e é exatamente de um desses que nasce o (no mínimo) histórico registro "Pet Sounds Live", gravado numa série de apresentações realizadas por Wilson e sua nova banda em janeiro de 2002, no Royal Festival Hall, em Londres, e lançado agora no Brasil.
"Vamos tocar o "Pet Sounds" inteiro", anuncia ele nos primeiros segundos do disco. "Vocês podem fechar os olhos agora."
Está nitidamente empolgado, assim como as dezenas de fãs ilustres presentes na platéia, que incluía Richard Ashcroft (The Verve), Chemical Brothers, Elvis Costello, David Gilmour (Pink Floyd), Kevin Shields (My Bloody Valentine), Paul Weller (The Jam), Eric Clapton e outros nomes de quilate semelhante.
"Wouldn't It Be Nice" abre o show/disco, com os mesmos arranjos da versão original, as mesmas sobreposições vocais, a mesma inocência e o frescor dos anos iniciais dos Beach Boys.
Seguem "You Still Believe in Me" e "That's Not Me", com seus emblemáticos versos "I have to prove/ that I can make it alone now/ but that's not me/ I have to show/ how independent I've grown/ but that's not me..." (Eu tenho que provar/ que consigo fazer sozinho agora,/ mas isso não sou eu/ Eu tenho que provar/ como me tornei independente,/ mas isso não sou eu...).
Se, naquela época, a mensagem parecia ser o conflito entre as vantagens de envelhecer e a necessidade de aproveitar ao máximo a energia da juventude do "american way of life", cantados hoje, os mesmos versos trazem a incômoda sensação de que Wilson continua tentando provar algo.
Ainda que "I'm Waiting for the Day", "Sloop John B", "God Only Knows" e a própria "Pet Sounds" pareçam irretocáveis, algo soa deslocado quando se tira a poeira de um dos mais importantes e coesos repertórios da história da música pop. Seria o excesso de metais, de orquestrações ou apenas o vocal aparentemente desgastado de Brian Wilson?
Some-se a isso algumas incômodas (para não dizer, no mínimo, embaraçosas) intervenções de Wilson entre uma faixa e outra do disco: "a música preferida do meu amigo Paul McCartney", "vamos fazer agora um instrumental, sem vozes", "eu disse que eles [os seus novos músicos" eram bons, não disse?" e por aí vai...
Sei que peco ao criticar a tão esperada volta aos palcos de Brian Wilson, que, com seus 60 anos recém-completados, não cabia dentro de si nas sessões de "Pet Sounds Live", mas, com o perdão do clichê, a verdade é que um raio (especialmente aquele que pegou de surpresa o pop americano naquele fatídico 1966) nunca cai duas vezes no mesmo lugar.


Pet Sounds Live   
Artista: Brian Wilson
Lançamento: Globo/Jive
Preço: R$ 25, em média



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