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MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Futuro do passado
Exposições e lançamentos rememoram a cultura "utópica" do último modernismo brasileiro
OS ANOS 60 voltaram. Oh, não!
De novo? Sim, e tem mais:
vieram escoltados pelos 50 e
também pelos 70, em exposições e
lançamentos que estão acontecendo
por esses dias. Não falo das mostras
internacionais, o verão hippie, em
Nova York, ou o punk, na Inglaterra.
Refiro-me às brasileiras: a grande
exposição sobre a tropicália, inaugurada no Rio; a que rememora a atividade crítica, criativa e de tradução
dos poetas concretos, prevista para
o dia 15, em São Paulo; e uma outra
que trará à tona os ainda desconhecidos "babilaques" do poeta Waly
Salomão, também no Rio.
Já tivemos há pouco o lançamento de uma pesquisa sobre o Centro
Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes e das obras do
"poeta marginal" Chacal. Anuncia-se para breve uma edição em homenagem ao crítico (que também foi
poeta) Roberto Schwarz.
Não é de hoje que a cultura brasileira da segunda metade do século
20 ocupa museus, desperta homenagens, produz edições rememorativas e seduz círculos internacionais
-mas o fenômeno parece estar em
expansão. É um processo natural de
formação de discursos históricos sobre aquilo que, afinal, já é história.
Alguém que hoje tenha 40 anos terá
nascido dez anos depois do início da
bossa nova e no ano em que Caetano
Veloso compôs "Tropicália" -num
Brasil que era outro país.
Se estendermos um arco sobre a
movimentação cultural nas artes, no
cinema, na arquitetura, no design,
na música, na poesia, no teatro, que
vai do início dos 50 a meados dos 70,
teremos, com muitos cruzamentos,
paralelismos e antagonismos, um
capítulo fundamental da formação
da cultura moderna brasileira -e
justamente aquele que a "fecha" e
consolida, pouco antes do funeral
das grandes utopias.
Os principais movimentos do período ainda se inscrevem no contexto do combate pelo "novo" e por um
ideal de futuro, seja no plano da experimentação de linguagens, com a
busca de formas "revolucionárias",
que superem o passado e a tradição,
seja no envolvimento da criação estética com projetos políticos de
transformação social.
Os nexos dessa produção com a
perspectiva modernista são evidentes, e não é difícil observar -para ficar num esquematismo- como
muitas vezes as linhas de divergência, em especial em São Paulo, corresponderam a um ou outro pólo do
movimento de 22, representados
por Mário e Oswald de Andrade.
A antropofagia oswaldiana foi, por
exemplo, uma bandeira do concretismo e do tropicalismo, em sua fome de absorção de signos da cultura
internacional -em contraposição à
visão mais sociológica e "nacionalista", que se poderia associar a Mário e
às correntes estéticas enraizadas na
universidade e na esquerda.
Muitos nexos -na verdade, os
mais interessantes deles-, estão
por ser estabelecidos, mas a historiografia sobre o período, ainda incipiente e lacunar, já se anunciou promissora em algumas pesquisas acadêmicas e em obras de quem fez parte dessa história, caso exemplar de
"Verdade Tropical", de Caetano Veloso, que deu e ainda deverá dar pano para manga.
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