São Paulo, quinta-feira, 09 de agosto de 2007

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MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

Futuro do passado

Exposições e lançamentos rememoram a cultura "utópica" do último modernismo brasileiro

OS ANOS 60 voltaram. Oh, não! De novo? Sim, e tem mais: vieram escoltados pelos 50 e também pelos 70, em exposições e lançamentos que estão acontecendo por esses dias. Não falo das mostras internacionais, o verão hippie, em Nova York, ou o punk, na Inglaterra. Refiro-me às brasileiras: a grande exposição sobre a tropicália, inaugurada no Rio; a que rememora a atividade crítica, criativa e de tradução dos poetas concretos, prevista para o dia 15, em São Paulo; e uma outra que trará à tona os ainda desconhecidos "babilaques" do poeta Waly Salomão, também no Rio.
Já tivemos há pouco o lançamento de uma pesquisa sobre o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes e das obras do "poeta marginal" Chacal. Anuncia-se para breve uma edição em homenagem ao crítico (que também foi poeta) Roberto Schwarz.
Não é de hoje que a cultura brasileira da segunda metade do século 20 ocupa museus, desperta homenagens, produz edições rememorativas e seduz círculos internacionais -mas o fenômeno parece estar em expansão. É um processo natural de formação de discursos históricos sobre aquilo que, afinal, já é história. Alguém que hoje tenha 40 anos terá nascido dez anos depois do início da bossa nova e no ano em que Caetano Veloso compôs "Tropicália" -num Brasil que era outro país.
Se estendermos um arco sobre a movimentação cultural nas artes, no cinema, na arquitetura, no design, na música, na poesia, no teatro, que vai do início dos 50 a meados dos 70, teremos, com muitos cruzamentos, paralelismos e antagonismos, um capítulo fundamental da formação da cultura moderna brasileira -e justamente aquele que a "fecha" e consolida, pouco antes do funeral das grandes utopias.
Os principais movimentos do período ainda se inscrevem no contexto do combate pelo "novo" e por um ideal de futuro, seja no plano da experimentação de linguagens, com a busca de formas "revolucionárias", que superem o passado e a tradição, seja no envolvimento da criação estética com projetos políticos de transformação social.
Os nexos dessa produção com a perspectiva modernista são evidentes, e não é difícil observar -para ficar num esquematismo- como muitas vezes as linhas de divergência, em especial em São Paulo, corresponderam a um ou outro pólo do movimento de 22, representados por Mário e Oswald de Andrade.
A antropofagia oswaldiana foi, por exemplo, uma bandeira do concretismo e do tropicalismo, em sua fome de absorção de signos da cultura internacional -em contraposição à visão mais sociológica e "nacionalista", que se poderia associar a Mário e às correntes estéticas enraizadas na universidade e na esquerda.
Muitos nexos -na verdade, os mais interessantes deles-, estão por ser estabelecidos, mas a historiografia sobre o período, ainda incipiente e lacunar, já se anunciou promissora em algumas pesquisas acadêmicas e em obras de quem fez parte dessa história, caso exemplar de "Verdade Tropical", de Caetano Veloso, que deu e ainda deverá dar pano para manga.


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