|
Texto Anterior | Índice
O outro Adriá
Irmão do celebrado chef Ferran Adrià, Albert Adrià, craque nos doces, defende importância da sobremesa
GIULIANA BASTOS
DO GUIA DA FOLHA
Não é fácil ser irmão de gênio. Os holofotes estão o tempo
todo ali, mas sempre voltados
para outro foco. Mas quando a
genialidade brota em um ex-administrador, filho de um pintor de paredes, em uma cidadezinha próxima de Barcelona, no
interior da Espanha, o quadro
pode ficar mais doce.
Em vez de ficar à sombra do
celebrado chef catalão Ferran
Adrià, Albert, o irmão do gênio,
foi à luta. Aos 16 anos, largou os
estudos para trabalhar no restaurante de Ferran, o El Bulli
(www.elbulli.com). Na época,
era apenas mais um restaurante à beira de uma baía, na Catalunha. Mas a casa já dava sinais
do caminho que ia trilhar.
Após dois anos conhecendo
as funções em uma cozinha, Albert se apaixonou pelos sabores, texturas e aromas de frutas, especiarias e chocolate e
nunca mais abandonou a estação das sobremesas. Hoje, com
38 anos, é considerado um dos
melhores doceiros contemporâneos, sendo o responsável
pelas sobremesas do que foi
considerado, por dois anos
consecutivos, o melhor restaurante do mundo, segundo a revista inglesa "Restaurant".
"Me considero um cozinheiro antes de tudo, mas nos doces
sentia um cheiro melhor que
na fritura", brinca.
Atualmente, Albert tem papel fundamental no sucesso do
El Bulli, como afirma o próprio
Ferran. Além de mostrar seu
talento nas sobremesas do menu-degustação, ele é o diretor
do laboratório, espaço instalado em Barcelona, de onde saem
as tendências que serão copiadas logo depois no mundo todo.
Hoje, a cada cem pessoas que
buscam estágio no restaurante,
apenas dez se interessam em
trabalhar na estação de pâtisserie do El Bulli. Sinal de que
poucos sabem que ali as sobremesas não são um universo à
parte, restrito ao último prato.
Na terra dos Adrià, os doces
também merecem destaque.
"A sobremesa tem de ser arrebatadora", defende Albert.
"É a última recordação do jantar, é como o final da festa."
Para tal, o chef tem ao seu
dispor quatro das 11 fases do
menu-degustação (pré-sobremesa, sobremesa, petit-fours e
"morphings" -espécie de pós-petit-fours), com cerca de quatro a sete receitas criadas no laboratório com técnicas e combinações inusitadas. Segundo
Albert, a tarefa de surpreender
comensais após mais de 20
pratos repletos de novidades,
emoções e pequenas brincadeiras é um grande desafio.
Um exemplo de como o chef
consegue tal proeza é a Cruz
Negra,
que, criada em homenagem a
outro catalão, o artista plástico
Antoni Tàpies, mescla praliné
de gergelim preto, espuma de
chocolate, molho de iogurte e
crocante de leite de cacau.
O chef esclarece, no entanto,
que "espuma já é algo do passado". Ele está trabalhando agora
na criação de um biscoito feito
em 40 segundos (no sifão e assado no forno microondas).
Arrepios no jantar
Convicto de seu trabalho e da
proposta revolucionária do El
Bulli, ele não teme as críticas
(muitas vezes até ri delas). As
que se referem às novas tecnologias, ele responde: "Garfo,
fouet, batedeira e sifão, todos
buscam o mesmo: incorporar
ar a um líquido".
"Não cozinhamos para este
senhor ou para aquele outro, e
sim para as 50 pessoas que vêm
comer aqui a cada noite, queremos que elas fiquem felizes e se
emocionem, se arrepiem duas,
três vezes com o nosso menu."
Os que querem se "arrepiar"
e podem "investir" 220 (cerca de R$ 580) em um jantar,
devem mandar um e-mail
(bulli@elbulli.com) ou ligar
(00/xx/34/972-150457) para o
restaurante e fazer a reserva
para a temporada de 2009. Antes disso, só os privilegiados
que já têm data marcada para a
felicidade. Aos outros, resta
torcer para que o chef e seu irmão, que vêm ao Brasil (incluindo São Paulo e Amazônia)
em dezembro, dêem uma palhinha por aqui.
Leia a receita da Cruz Negra, de Albert Adrià
Texto Anterior: Tentações Índice
|