São Paulo, domingo, 09 de agosto de 2009

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Crítica/DVD

Pialat evita melodrama e cria elos entre pintura e cinema em "Van Gogh"

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

A eterna relação de fascínio entre o cinema e a pintura flutua desde a inspiração até o vampirismo daquele frente a esta. Quando se trata de biografar artistas então, os filmes parecem antes de tudo querer projetar ideais raros, quando não inexistentes. Dos "heróis irresistíveis" da arte, o nome de Vincent van Gogh tornou-se um lugar-comum, com sua mistura de ícone romântico, reconhecimento tardio e mito rebelde.
O suicídio que encerrou sua trajetória curta e fulgurante pôs fim com chave de ouro a uma história feita sob medida para o cinema e sua queda pelo melodrama.
Quando chegou às mãos do diretor francês Maurice Pialat em 1991, o mito já havia recebido revisões assinadas por grandes como Resnais, Minnelli e Altman, além de um curta feito pelo próprio Pialat nos anos 60. Conhecido mais por seu temperamento irascível do que pelo rigor e pela forma antiespetacular de seu trabalho, Pialat aborda o artista enquanto mito pela contramão. Inadequação, incompreensão e insubordinação às regras não constituem valores em si, demonstra o diretor a partir de seu modelo, dando a entender que o raciocínio aplica-se sem mudanças a seu trajeto de autor.
Logo, o "Van Gogh" de Pialat será tão idiossincrático quanto o ultraromântico de Minnelli e o despojado de Altman. No entanto, em vez de se perder em confissões, Pialat recupera explicitamente em "Van Gogh" sua própria experiência como pintor, prática que exerceu antes de se converter em cineasta.

Sem ilusionismos
Com o álibi de filme sobre artista, Pialat executa um dos mais profundos trabalhos pictóricos já feitos no cinema, sem permitir confundir pintura com empetecamento da imagem ou com a reprodução impressionante, mas sem sentido, da obra de Van Gogh realizada por Kurosawa em "Sonhos".
O diretor francês nos faz ver que entre cinema e pintura a similitude não se esgota na superfície da tela, nos acordos de luz e cor que muitas vezes nos levam a perder nosso olhar no ilusionismo da beleza.
É na concepção de quadro, espaço delimitado por quatro linhas que se abrem ou se fecham que tanto pintor como cineasta impõem uma visão (no sentido de ponto de vista) ao espectador.
O artista, então, passa a ser aquele que oferece uma experiência sublime, que nos arranca do torpor, mesmo quando retrata um tema ou uma vivência identificada como banal (exemplar, aqui, no modo como Van Gogh é um homem sem qualidades). Os outros não passam de captadores de imagens.


VAN GOGH

Lançamento: Versátil
Quanto: R$ 44,90
Classificação: 16 anos
Avaliação: ótimo




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