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LIVROS/LANÇAMENTOS
LITERATURA
"Os Vermes", de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta, mostra disputas em cidade imaginária
Verme traz à tona os bastidores do poder
Adriana Elias/Folha Imagem
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José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta (ao fundo), autores de "Os Vermes", que está sendo lançado pela Objetiva |
MARCELO RUBENS PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Helmino é um jovem verme rotífero, com cílios para comer e andar. No primeiro dia de vida, está
de papo para o ar, sobre uma folha de alface, ouvindo música ambiente, quando é engolido por um
político, a bordo de um avião.
As andanças do verme pelo corpo do político, chamado de Ele, e
as intrigas pelo poder em Arca, a
capital de um país imaginário,
formam a narrativa de "Os Vermes", fábula de José Roberto Torero, colunista da Folha, e Marcus
Aurelius Pimenta.
Arca é uma cidade planejada,
inspirada no corpo humano. Os
bairros são setorizados. Os pobres
moram nos pés, especialmente
nos calos, os bordéis ficam no
ventre e o setor de bares fica no
bairro do Fígado. A sauna só poderia estar no sovaco esquerdo.
Vista do alto, a capital era para
parecer um homem sorrindo.
Mas, num erro de cálculo, o sorriso, a praça da Gargalhada, saiu
muito aberto e Arca ganhou um
ar abobalhado, em que no olho
direito está o Congresso e, no esquerdo, o Sumo Tribunal. É evidente que Brasília, as conspirações políticas, a sede pelo poder e
as disputas inspiram a trama.
Torero e Pimenta já publicaram
juntos "Terra Papagalli" e "Santos, um Time dos Céus" e escreveram a peça "Omelete".
Folha - Vocês conheciam, antes,
os detalhes da vida de um verme
em um corpo humano?
José Roberto Torero - Não. Pesquisamos. Está quase tudo correto. O verme existe mesmo. Mas
não iria até o cérebro, como o narrador. É do tamanho de um ponto
final. Não faz mal, não é um parasita prejudicial.
Marcus Pimenta - Ele fica mais
no pâncreas.
Folha - O livro nasceu já com um
narrador que é um verme?
Torero - A primeira idéia era um
lobista narrando sobre uma cidade chamada Arca. Foi na quinta
versão que decidimos fazer com
que o verme fosse o narrador.
Folha - O pano de fundo do livro é
a disputa entre os que defendem a
privatização e os contrários?
Torero - A idéia é mostrar essa
passagem de uma casta política
para outra. A que se metia mais
com empreiteiros, da década de
70 e 80, e a que se relaciona mais
com bancos e mercados de capitais, como a de hoje. Ambas são
do mal.
Folha - Quem vocês entrevistaram?
Torero - Muitos jornalistas, que
ajudaram a dar essa idéia e escolher o que contar. Para mostrar
essa mudança da elite política,
tem de se montar uma grande votação, pois é nas grandes votações, como por exemplo na da
reeleição, que se vêem os mecanismos de corrupção e como funciona a divisão do poder.
Pimenta - É assim que eles preparam a base econômica para
uma próxima eleição.
Folha - O que existe de real nas
personagens?
Torero - Muitas biografias dos
nossos políticos são baseadas em
fatos reais. Mas tem histórias
reais, que contaram para a gente,
que são melhores do que a gente
escreveu, como a de um político
que fez uma festa de travestis, dizendo que eram travestis apoiando o inimigo. Não dá para concorrer. A realidade é melhor.
Folha - Por que há tanta escatologia?
Pimenta - É o mundo do verme.
E combina com a moral da história. A luta pela glória é ilusória e
sem sentido.
Torero - Tem uma tese que diz
que o rei, na Idade Média, era um
representante de Deus. De certa
forma, o político também se acha
uma divindade, pois consegue
mudar a vida de alguém rapidamente. Ele é endeusado.
Pimenta - Eles se acham indestrutíveis, poderosos.
Torero - Dentro do Congresso,
tem uma senhora que oferece
moças para servir aos deputados.
Todos estão lá sem família, com
dinheiro, poder.
Folha - Esse livro é o mais engraçado que fizeram?
Pimenta - Engraçado é que, na
vida real, a menor forma de vida
vai comendo a maior. E o que ganha é o protozoário.
Torero - Esse livro tem mais piadas. O narrador, um verme, empurrou muito para o humor. O tema, política, também. Iria ficar insuportável sem humor.
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