São Paulo, sexta-feira, 09 de setembro de 2005

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"FOME DE VIVER"

Efemeridade da paixão movimenta cult dos anos 80

SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL

O revival dos anos 80 atinge finalmente o cinema. O Cinesesc estréia hoje em São Paulo cópia nova de um clássico da Década Perdida, "Fome de Viver". Se você conseguir ultrapassar a crueldade que aquele período fez com os cabelos e roupas das pessoas, estará diante de um filmaço, do gênero "vampiro", subgênero "romance", subdivisão "imortalidade do amor".
Miriam (Catherine Deneuve, linda, sexy, sedutora aos 40 anos) é uma vampira-rainha milenar que, com ajuda do amante atual, John (David Bowie, contido e menos andrógino), precisa se alimentar de carne humana para manter a juventude. Até que, por motivos que revelariam a trama além do preciso, entra em cena a médica Sarah (Susan Sarandon, linda, sexy e sedutora aos 37).
Estará formado o triângulo bissexual dominado por Miriam e do qual alguém terá de abrir mão.
Em 1983, Tony Scott era um talento vindo da publicidade britânica que se mostrava a Hollywood pela primeira vez. Depois, conduziria uma obra irregular, cujo ponto alto é "Amor à Queima-Roupa" (1993), o primeiro script que Quentin Tarantino conseguiu vender e que fosse filmado por alguém importante e um dos filmes mais românticos do cinema.
Em "Fome de Viver", Scott já mostra um traço que só aprimoraria nos filmes seguintes; o cuidado com a trilha sonora, não só como ruído de fundo, mas como um dos atores de cenas-chave. Seria assim, por exemplo, em "Amor". Quem viu jamais esquecerá o interrogatório conduzido por Christopher Walken no trailer de Dennis Hopper, ao som do dueto do ato dois da ópera "Lakmè", de Delibes.
A mesma e belíssima música, infelizmente banalizada depois pela indústria publicidade, seria recorrente em outros filmes de Tony ou de seu irmão, Ridley, inclusive no próprio "Fome". Neste, são outras duas as canções mais, sem trocadilho, tocantes.
A primeira abre o filme, quando John e Miriam saem à caça de carne humana numa boate que bem poderia ser o Radar Tantan de São Paulo dos anos 80 ou o Crepúsculo de Cubatão do Rio, ao som da gótica "Bela Lugosi Is Dead", tocado por uma das bandas mais interessantes daquela época, Bauhaus. (Que o jovem leitor desculpe o uso da palavra "gótica", que revela a idade do repórter...)
A segunda é o trio entre John (cello), Miriam (piano) e a jovem violinista Alice (Beth Ethlers), que tocam o "Prelúdio" da "Suíte nš 1 para Solo de Cello" de Bach. É o momento em que John começa a sentir os efeitos da maldição passada por sua amante e o espectador antecipa o frio na espinha do que virá, tanto para ele quanto para a inocente Alice.
"Fome", de certa maneira, complementa "Blade Runner", feito um ano antes pelo irmão Ridley. Lá, é a dúvida que move a humanidade (e aparentemente os andróides): "Quando eu vou morrer?". Aqui, é a dúvida que tira o sono da humanidade (e aparentemente dos vampiros): "Meu amor durará até este dia?".


Fome de Viver
The Hunger
    
Direção:
Tony Scott
Produção: Reino Unido, 1983
Com: Catherine Deneuve, David Bowie
Quando: a partir de hoje no Cinesesc


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