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FESTIVAL DE VENEZA
Morte de Akira Kurosawa ofusca competição
AMIR LABAKI
enviado especial a Veneza
Uma projeção especial de "Madadayo" (1993) estende hoje o
adeus de Veneza a Akira Kurosawa, morto no domingo. A história
deve registrar este como o festival
da despedida. Nenhuma das novidades nas telas aproxima-se do impacto do desaparecimento do último samurai do cinema japonês.
A primeira sessão celebratória
encerrou-se na madrugada de ontem. Foi exibida uma cópia histórica de "Rashomon" (1950), a mesma projetada há 47 anos quando o
filme conquistou o primeiro Leão
de Ouro de Kurosawa.
Os créditos foram atração à parte, confirmando o desconhecimento no Ocidente da equipe do
filme. Veneza viu "Rasciomon" e
concedeu o Leão de Ouro a "Achira Curosawa", muito graças ao desempenho de "Tosciro Mifune".
O impacto do filme, parábola sobre a verdade, permanece intacto.
A coragem dos jurados da época
ainda surpreende. Intensamente
dialogada, a introdução apresenta
sintéticas legendas em italiano. A
tradução segue econômica até o final. Fez-se valer o poder visual da
elíptica narrativa de "Rashomon".
O ex-presidente da Bienal de Veneza, Gian Luigi Rondi, lembrou
nas páginas do "Corriere della Sera" sua participação no júri que
premiou "Rashomon". "Lutei por
aquele outsider", recorda.
O júri estava dividido, e Rondi
convenceu os colegas. "Comoveu-me tanto o tratamento pirandelliano da história quanto o esplendor
das imagens." Até o fim da vida,
Kurosawa o presentearia com um
desenho nas festas de fim de ano.
Kurosawa não estava em Veneza
quando da premiação. Não havia
sido informado de que "Rashomon" participava do festival. "Em
1950, os produtores haviam me
obrigado a cortar uma hora e meia
de "O Idiota' e até destruíram os
negativos para não ter volta", lembra o cineasta.
"Numa noite, voltei para casa desesperado por aquele massacre,
havia mesmo decidido a mudar de
profissão, quando minha mulher
veio ao meu encontro na sala dizendo: Parabéns pelo prêmio em
Veneza."
"Eu não sabia que "Rashomon' tinha sido mandado a um festival do
Ocidente", prossegue Kurosawa.
Não seria este o único triunfo de
Kurosawa por aqui. Em 1954, "Os
Sete Samurais" lhe valeu um Leão
de Prata, que retirou pessoalmente. Em 1982, foi homenageado por
um Leão de Ouro especial pela carreira. "Veneza sempre me trouxe
sorte", reconheceu o cineasta. "E
uma vez me salvou do desespero."
A sessão hoje de "Madadayo"
tem a um só tempo sabor de estréia
e de despedida. O último filme realizado por Kurosawa jamais entrou em cartaz nos cinemas italianos (no Brasil, existe mesmo em
vídeo).
"Madadayo" trata da relação terna entre jovens japoneses e seu
querido professor aposentado. A
cada aniversário do mestre, a reunião de alunos recusa-se a dizer
adeus: "Ainda não!" (Madadayo!).
Com Kurosawa em mente, o grito
relançado em Veneza vai ecoar
nesta noite pelo mundo inteiro.
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