São Paulo, terça-feira, 09 de outubro de 2001

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"PARADE"

Exposição mostra universo moderno em desfile em SP

FELIPE CHAIMOVICH
CRÍTICO DA FOLHA

No momento em que colhemos as incertezas plantadas pelo século mais assassino da história, "Parade" chega a São Paulo como uma brisa de esperança. A mostra reúne obras-primas do poder criador concentrado em Paris nos últimos cem anos.
O acervo provém de um museu de primeira grandeza. O Centro Pompidou não mediu esforços para enviar aos trópicos peças do mais alto valor estilístico e histórico. O espectador brasileiro poderá ver obras que figuravam nas salas de exibição permanente do Beaubourg até antes da recente reforma do prédio parisiense, como "As Duas Barcas", de André Derrain, e "Os Poderes do Desastre", de Roberto Matta.
A curadoria tematiza o século 20. Os núcleos de exibição dividem-se cronologicamente. Como num panorama acelerado, vemos desfilar momentos cruciais da reflexão da arte moderna sobre o desenrolar da cultura sob o ponto de vista da grande capital da civilização ocidental.
Os primórdios da arte moderna mostram a fé no poder crítico da criação. É emblemático o filme "Viagem à Lua" (1902), de Méliès: uma sátira simbolista aos altos valores da França positivista. O público poderá ver uma cópia projetada na calota do prédio, como num planetário.
O deleite com o período anterior à Primeira Guerra estende-se pela sala expressionista de Kandinsky, pelos "fauves" de primeira linha e pela enigmática roda de bicicleta de Duchamp (1913).
A poética da vanguarda clássica é realçada pela ousadia da montagem primorosa. A "Musa Adormecida" (1910), de Brancusi, parece dançar com a "Cabeça de Mulher" (1912), de Modigliani, devido ao efeito de uma iluminação giratória. A crença na revolução comunista merece destaque. A vanguarda abraçou os ideais da Revolução de Outubro de modo emblemático no "Modelo do Monumento à Terceira Internacional" (1919), de Tatlin, e na exaltação da máquina no "Balé Mecânico" (1923), de Léger.
O mergulho europeu na decadência do entre-guerras foi registrado de forma dialética. Por um lado, a exacerbação do pensamento cartesiano está presente na amostragem de design: Le Corbusier, Eileen Gray, Jean Prouvé. No extremo oposto, a irracionalidade surrealista questiona os esquemas tradicionais de diversas mídias: fotografia, cinema, escultura.
A criteriosa seleção de obras do pós-guerra põe em cheque a propagandeada perda da posição central de Paris para Nova York. Como não admitir a qualidade da pintura informal de Staël, Riopelle e Mathieu?
A utilização de pequenos monitores para dialogar com as obras é especialmente esclarecedora na exibição de Yves Klein.
O contemporâneo emerge em toda sua multiplicidade por meio de núcleos localizados no subsolo. Estações de vídeo e salas isoladas permitem uma visita sem nenhuma confusão visual, apesar da profusão de estilos exibidos.
A curadoria ora opta por aproximações entre semelhantes, como na abstração gestual de Mitchel, Soulages e Michaux, ora pela ruptura criadora, como na sala azulejada que agrupa uma obra op de Soto e os instantâneos da inauguração de um templo disco ao som de música dancing.
A saída é apoteótica. Sobem as rampas os 602 desenhos de Corpet, representando a herança sadomasoquista que marca as práticas sexuais européias hoje. Por fim, encontramos a eterna surrealista, Louise Bourgeois. O prédio orgânico é ocupado por um percurso de tirar o fôlego. E o chapéu.


Parade     
Onde: Oca (av. Pedro Álvares Cabral, s/ nš, portão 2, parque Ibirapuera, tel. 0/ xx/11/5573-6073)
Quando: de ter. a qui., das 9h às 21h; sáb. e dom., das 10h às 21h. Até 15/1
Quanto: R$ 7



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