São Paulo, Terça-feira, 09 de Novembro de 1999
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RENT, UM MUSICAL NO BRASIL
No teatro Ópera, candidatos tentaram obter lugar no elenco cantando até "Meu Erro"
Na pré-seleção, Bexiga parecia o Bronx

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Como São Paulo não é Nova York e nem "Rent" é "Hair" ou "A Chorus Line", o ambiente "jovens artistas lutando para ser percebidos" também foi adaptado à brasileira no processo de seleção ocorrido há dois meses.
O cenário é o teatro Ópera (ex-Studium, ex-Záccaro, ex-Aquarius), na rua Rui Barbosa, em outros tempos palco de programas do Chacrinha e, até, da primeira versão brasileira do musical hippie "Hair", então com Sonia Braga e Antonio Fagundes no elenco.
Centenas de candidatos cantaram e dançaram para uma comissão chefiada pelo diretor artístico Billy Bond, 53, na pré-seleção -para que a equipe norte-americana dê o veredicto final.
"A primeira qualidade é cantar direito. É uma história de amor contada em tempo de rock, espécie de ópera adaptada de "La Bohème", de Puccini. Interpretar é a segunda qualidade. Quem canta pode aprender a interpretar com facilidade, o contrário é mais difícil", disse Bond, antes dos testes.
Primeiro candidato, Reinaldo, 21. Canta "Seasons of Love", Bond se espanta: "Já conhece o espetáculo?". "Seasons of Love" é uma das canções de "Rent". "Nossa, ele já sabe a música." "É que eu assisti à peça "Pocket Broadway", uma colagem de musicais", explicou depois Reinaldo.
O repertório se dispersa. Marcelo, 29, vai de "Ticket to Ride", dos Beatles. A terceira candidata tenta acertar o tom com o maestro, Bond comenta: "Não existe cultura de partitura no Brasil. Assim demora, irrita o júri".
Filipe, 18, Gustavo, 28, e Diogo, 20, aparentemente de um mesmo grupo teatral, cantam a mesma música, sobre playback, lendo a letra numa folha de papel. "Chegam aqui e não jogam tudo que têm na vida para ganhar uma chance. A postura não é de quem quer muito a chance. Eles não têm nenhuma chance", crava Bond.
Mais Bexiga que Bronx são José, 31, e André, 24. O primeiro teatraliza "Meu Erro", dos Paralamas do Sucesso -hit entre os aspirantes a astros da Broadway da Rui Barbosa; adiante aparecerá Thiago, 22, com "Caleidoscópio".
De André em diante -incluindo Thiago-, Renato Russo aparece como o fantasma da ópera dos testes. André faz "Blue Moon", entre Elvis e Russo. Seguirão versões Renato Russo de "Over the Rainbow" ("dançou"), "Bete Balanço", Red Hot Chili Peppers ("no chance"), Guns'n Roses ("tem ar, sabe respirar").
Sérgio, 30, foge à regra pop e opta por "My Funny Valentine". "Você não tem nada popular?", pergunta Bond. "Trouxe tudo Gershwin, Cole Porter", atrapalha-se o candidato. "Está bem, obrigado", encerra Bond.
Rosemeire, 30, insinua "Summertime", e Bond nem espera: "Tem de ter coragem para cantar isso. É a melhor de todos até agora". E a dispensa, sem delongas.
Intervalo, comentários. "A bichinha do piano é ótima." "A crioula canta pra caramba."
Maurício, 27, negro, ex-aluno de Oswaldo Montenegro, extrovertido e de voz potente e funkeada, entusiasma o diretor. "Já ganhou. É a cara da peça."
Bibba, 31, pára nos primeiros acordes de "Summertime". "Desce, Bibba", manda Bond. "Essa entra com absoluta certeza." Ela integrou, como outros que a seguem, o elenco do musical "Pocket Broadway", exibido em 96. Juntos, Bibba, Luiz, 23, Fábio, 22, David, 24, Jarbas, 30, e Neusa, 30, modulam um coral gospel mais Bronx que Bexiga. "A leva está toda aprovada", cochicha Bond.
Não sobra para George, 28, ao violão. "Me perdi, estou nervoso. Depois do show então..." O Bexiga vive seus dias de Bronx.


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