|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DISCOS/LANÇAMENTOS
Quando ele não era invencível
Michael Jackson reedita discos solo e com o Jackson 5 para vitaminar o lançamento do novo "Invincible"
DA REPORTAGEM LOCAL
Michael Jackson , 43, mito endividado e megalomaníaco, precisa vender muitos
exemplares de "Invincible". Para
fechar o cerco, resguardou o lançamento deste seu novo CD com
capangas da pesada -se "Invincible" não corresponder às expectativas, alguém terá de fazê-lo.
Por isso, um pouco antes de
"Invincible" nascer a Motown internacional liberou uma minicoleção de três CDs que agrupa, dois
a dois, seis álbuns de seu grupo de
origem e de família, Jackson 5 (a
Universal promete lançar no Brasil, mas só no ano que vem).
Agora, poucos dias após o novo
rebento, chegam (também ao
Brasil, pela Sony) as reedições de
luxo -cheias de bônus obscuros
e falatórios- das quatro peças
mais importantes de sua carreira
solo. A ofensiva parece funcionar:
"Invincible" já ocupa o topo das
paradas inglesas e americanas.
O pacote Jackson 5 corresponde
à segunda fase do grupo, após o
apadrinhamento por Diana Ross
(então líder das sensacionais Supremes), a estréia em disco quando Michael tinha 11 anos e a explosão de sucesso comercial.
Começa com o colorido "Goin"
Back to Indiana" (71), trilha bocó
de TV, e "Lookin" through the
Windows" (72), que segue o mote
de funk e soul adocicados dos três
primeiros álbuns do quinteto.
O segundo volume reúne
"Skywriter" e "Get It Together"
(73) -os Jackson 5 entravam em
fase "black power", "black is
beautiful", de resultados extraordinários. Com "Dancing Machine" (74) e "Moving Violation"
(75), o terceiro CD oscila entre
acomodação e ocaso da fórmula.
Ficam dali uma sacola de grandes funks e as fortes imagens do
garotinho black power, que mesmo caçulinha era a maior voz e o
furacão corporal do grupo. E fica
o contraste chocante do menino
negro que virou objeto ambíguo,
branco e plastificado de adoração.
Se pequeno Michael já fazia LPs
solo, só em 79, com 21 anos e bigodinho nascente, começaria a almejar o estrelato solitário, entregando ao produtor Quincy Jones
o futuro de "Off the Wall" e de
uma promissora nova história.
"Off the Wall" é, o tempo todo,
um disco sobre sexo. Inventando
um imaginário de falsetes, gritinhos e gemidos, molhava "Don't
Stop "til You Get Enough" com
declarações de "chegue perto do
meu corpo agora", "continue forte/ não pare até se saciar". A canção-título falava sobre viver do lado de fora do muro, sobre "esconder suas inibições", sobre como
"viver maluco é o único jeito".
E então a faixa-título de "Thriller" (82) tornava Michael breve
cantor de terror perseguido por
"uma coisa de 40 olhos" e, então,
o maior vendedor de discos do
planeta. Mas algo estranho já
acontecia com o rapaz e se realizava na figura de Billy Jean, uma
mulher "mentirosa" que aparecia
de leve no funk quebra-barraco
"Wanna Be Startin" Somethin" ".
Entre petardos como "Beat It",
"The Girl Is Mine" e "Human Nature", chegava à "Billy Jean" propriamente dita, e ela era garota
malvada exigindo que o narrador
assumisse sua criança. "O garoto
não é meu filho", ele gritava.
"Bad", cinco anos mais tarde,
teria a missão de afogar a síndrome do megassucesso de "Thriller". E, surpresa, Michael aparecia na capa de nariz fino, branco,
mas querendo parecer a mulata
Diana Ross, para escândalo da
platéia. No disco, ele (ela?) se proclamava mau, encarnava um demônio veloz ("Speed Demon",
substituindo sexo por bravata automobilística), xingava uma certa
Diana suja ("Dirty Diana").
Em "Man in the Mirror" nascia
sua face culpada, de um agente
social que precisava se lembrar
das "crianças na rua sem ter o que
comer" e se desculpava "vítima de
um tipo egoísta de amor".
A ciranda de incompreensão
-de fora e auto-imposta- oprimia o homem mais famoso da
Terra, e "Dangerous" (91) é o testemunho malcompreendido de
seu inferno interior. Perigoso, era
como se declarava então o cara
que declararia portar vitiligo, teria
filhos com uma enfermeira e seria
acusado de molestar crianças.
"Não importa se você é negro
ou branco", cantava em "Black or
White", como se conversasse com
o Michael pequenino, negro e degolado precocemente (e a faixa
"Gone Too Soon" chorava: "Morreu cedo demais").
O pandemônio era bem maior:
"Sou condicionado pelo sistema"
("Jam"); "dizem que sou diferente/ não entendem/ mas há um
problema muito maior", "parem
de me molestar" ("Why You
Wanna Trip on Me", que cita
"doenças estranhas que médicos
não sabem curar"); "me perdoarão?", "sou o morto" ("Who Is It",
volta subliminar de Billy Jean)...
A face "We Are the World", demagógica, dava ares de autopiedade a um homem que antes só
queria a dança e o funk. Paradoxalmente, fora dos hinos épicos
para cantar de mãos dadas a música continuava muito negra.
Michael continuava a se autoconstruir, não para parecer branco ou preto, homem ou mulher,
senhor ou escravo -as cirurgias
plásticas aperfeiçoavam seu aspecto fetal, mais que o resto.
Mais seis anos, e ele agora era
"intocável", "inquebrável" ("Unbreakable"). Adiante, uma figura
apelidada "ela" era xingada porque partia corações ("Heartbreaker"), porque era invencível. É cedo para interpretar "Invincible",
mas talvez o segredo estivesse em
"Speechless": a maior e mais trágica figura pop do século 20 chegava ao 21 sem fala, palavras, discurso. Mas o conto de fadas macabras seguia, ainda emocionante.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Jackson 5
Grupo: Jackson 5
Lançamento: Motown/Universal
Quanto: R$ 52, em média, cada CD
importado (três títulos)
Onde encomendar: Bizarre (tel. 0/xx/
11/220-7933)
Special Edition
Artista: Michael Jackson
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 25, em média, cada CD
(quatro títulos)
Texto Anterior: Ruído: Roberto Carlos reestréia show velho Próximo Texto: Outros lançamentos Índice
|