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LIVROS/LANÇAMENTOS
"A MALDIÇÃO DO MACHO"
Em romance, escritor de destaque da nova geração de autores aborda a urgência do sexo
Oliveira narra a cegueira do desejo masculino
MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA
"A Maldição do Macho",
título do novo romance
do escritor paulista Nelson de Oliveira, parece ter saído de um filme
pornô. Há um fiapo de trama, um
protagonista macho, mulheres
variadas, orgias, cenários kitsch e
uma certa ousadia técnica urdida
na parcimônia intencional dos recursos romanescos.
Rodrigo, o protagonista, é um
ser movido pela urgência do sexo.
Fugiu de casa aos 11 anos, morou
22 em Londres, onde virou pintor:
com a idade de Cristo é chamado
de volta a Ouro Preto, para o enterro da tia que o criou. Em sua
bagagem, três gravuras eróticas
roubadas, supostamente valiosas.
Diz ele: "Duas cópulas por semana. (...) Às vezes muito mais.
Necessitamos da carne feminina,
caso contrário enlouquecemos.
Esta, a maldição do macho". E logo abaixo: "O pau, ponte para o
paraíso. Nós que o trazemos entre
as pernas não conseguimos raciocinar direito sem a ajuda dele".
A maldição não se refere à necessidade do sexo, mas ao fato de
o desejo embotar a razão. Rodrigo
crê possuir as mulheres, mas, no
fim, se vê possuído por elas. De
caçador a caça: sua condição de
copulador o impede de enxergar a
realidade que inopinadamente
lhe rege os passos e o emascula.
Sugere-se a afiliação da obra a
uma certa vertente erótica atual
da literatura brasileira, de Dalton
Trevisan a João Ubaldo Ribeiro.
Confrontemo-la com uma das autoras citadas, Hilda Hilst. Crasso,
de "Contos d'Escárnio", e Tiu e
Karl, de "Cartas de um Sedutor",
têm mais densidade, humor e ressonância poética, sendo postos
em perspectiva, ironizando e sendo ironizados a cada instante.
Há menos trama nesses romances de Hilst, talvez trama nenhuma. A estrutura dramática é rudimentar: mas como seus personagens aspiram a profundidades tão
mais sombrias, como se germanam organicamente com uma
tradição que vem de Rabelais e
Sade, transformando-a!
Oliveira fica a um passo desse
ideal. Pode ser covardia compará-lo à possivelmente maior escritora brasileira viva, mas Oliveira
tem méritos. É um fino prosador,
dos melhores da nova geração,
como atestam suas ficções. Esperávamos mais dele, neste romance. Continuamos à espera.
A Maldição do Macho
Autor: Nelson de Oliveira
Editora: Record
Quanto: R$ 25 (226 págs.)
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