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EXPOSIÇÃO
Carlos da Fonseca reúne fotos e cartas de descendentes de escravos alforriados em Brasília
Cartas D'África conta história pós-Lei Áurea
ANA FLOR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Na era do e-mail, cartas trocadas entre dois continentes podem
contar parte da história brasileira
pós-Lei Áurea. A exposição Cartas D'África, do historiador, fotógrafo e diplomata brasileiro Carlos da Fonseca, 40, que abre hoje
ao público, em Brasília, mostra
fotos e cartas de descendentes dos
escravos alforriados brasileiros
que retornaram à África. São famílias que, apesar de viverem em
Benin, no Togo, em Gana ou na
Nigéria, ainda carregam sobrenomes como Rocha, Martins, Cruz
ou Monteiro.
A exposição revela as duas pontas de uma história comum. É o
caso de Maria Angélica da Rocha,
64, em Lagos (Nigéria), que leva a
foto da prima distante Maria Augusta, de Salvador, na Bahia. No
instantâneo seguinte, Maria Augusta mostra a foto de Maria Angélica. Ao lado das duas fotos, a
história do provável parente comum: Francisco Félix de Souza,
mulato baiano que voltou ao Benin por volta de 1800.
Outra parte da exposição mostra descendentes na África que
procuram seus familiares no Brasil. As fotos mostram suas cartas e
a esperança de reencontrá-los. Segundo Fonseca, os visitantes serão estimulados a escrever cartas
aos irmãos -de sangue ou não-
nos países africanos.
As estimativas são de que menos de 10 mil escravos libertos retornaram à África no decorrer do
século 19. Os principais motivos
foram a estagnação econômica,
medo de represálias ou de serem
reescravisados.
O interesse de historiador pelo
destino dos alforriados que voltaram para a África, as habilidades
de fotógrafo e o gosto de diplomata em unir o Brasil a outros países
levaram Fonseca a produzir um
material visual rico e inédito sobre os laços entre Brasil e África.
Fonseca iniciou o trabalho em
2000, com o objetivo de reviver a
trajetória dos "retornados". Desde lá, já entrevistou 50 famílias.
Fonseca sabia que existiam na
África elementos da cultura
aprendida no Brasil. Mesmo assim, foi surpreendido com os vínculos culturais ainda existentes.
A influência de ex-escravos pedreiros e carpinteiros influenciou
a arquitetura, com a construção
de bairros brasileiros que resistem até hoje. Em Gana, há a chamada comunidade Tabom - nome que deve ter vindo da expressão "tá bom". Em Benin, a festa de
Nosso Senhor do Bonfim é comemorada no terceiro domingo de
janeiro com missa e variações do
"Bumba meu Boi".
Cartas D'África faz parte da terceira edição da Jornada África-Brasil, que segue até 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. A
abertura oficial da jornada será
hoje, às 11h, na Câmara dos Deputados.
Entre as principais atrações deste ano estão a exposição "Deslocamentos", da artista Marie Ange
Bordas, sobre um trabalho de três
anos com refugiados africanos vivendo na África do Sul, Quênia e
França. A exposição multimídia,
com fotos, vídeos e trilhas sonoras, abre hoje e segue até 18 de novembro na galeria Athos Bulcão
do Teatro Nacional.
O fotógrafo Januário Garcia
apresenta, a partir de quarta-feira,
no Conjunto Cultural da Caixa, a
exposição Netos e Bisnetos de Escravos, com 50 fotos que mostram o cotidiano dos negros no
Brasil.
A jornada terá ainda exposições
dos fotógrafos moçambicanos,
filmes do diretor senegalês Ousmane Sembene, shows e oficinas.
EXPOSIÇÃO CARTAS D" ÁFRICA. de
Carlos da Fonseca. Quando: até 19/11,
das 9h às 18h. Onde: Anexo 2 da Câmara
dos Deputados, em Brasília.
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