São Paulo, quarta-feira, 09 de novembro de 2011

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CRÍTICA ROMANCE

Escrito em 1976, "O Monte do Mau Conselho" trata a política por via lírica

NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em 1946, em Jerusalém, havia a urgência de bronzear-se. Fazia-se o que fosse preciso, até sob o risco de prejudicar a saúde, para que a pele ficasse mais morena. Mas a razão para isso era praticamente oposta à atual, centrada na beleza.
O próprio menino Amós Klauzner, quando mudou-se voluntariamente para um kibutz, aos 15 anos, adotou o nome de Oz, que significa "coragem, valentia", e seu sonho era ser atlético, bronzear-se e, quem sabe com isso, esquecer a personalidade intelectual e melancólica de seus pais e do arquétipo do imigrante europeu.
Bronzear-se significava ser capaz de enfrentar os ingleses, de construir um Estado novo, de enfrentar o deserto e as intempéries políticas e naturais.
O romance "O Monte do Mau Conselho", escrito em 1976 e que ganha agora excelente tradução de Paulo Geiger, não deixa de ser uma espécie de autoficção.
O menino Uri -que em tudo, inclusive na personagem da mãe bela e triste, lembra o autor- está presente nos três episódios da narrativa, independentes e relacionados ao mesmo tempo.
Ambientadas na então Palestina, logo antes da Guerra da Independência, numa Jerusalém inteiramente dividida, pobre e árida, as três histórias enxergam o mundo pelos olhos de Uri, um menino de seus 11 anos, incompreendido pelo excesso de curiosidade, imaginação e envolvimento político.
À sua volta aparecem o pai e a mãe, assim mesmo, sem nomes. A mãe, uma mulher bela e desejada por todos, sempre inconformada com as medíocres tarefas domésticas e a contemplar distâncias no horizonte.
O pai, um veterinário fracassado, obrigado a trabalhos bem menores do que o alcance de seu idealismo. Como sempre nos romances de Oz, a visão histórica e política entra por uma via torta, puramente narrativa e lírica, como deve ser para que a literatura se sustente.
Não há panfletagem nos livros de Amós Oz e sua luta, na vida como nos livros, é sempre contra os fanáticos: "São pessoas que sempre têm certeza absoluta, sem a menor dúvida, de que sabem exatamente o que é bom e o que é ruim e o que é preciso fazer, e exigem com muito rigor que todos pensem e ajam como elas".
Oz não abre mão dessa única certeza e evita até o fanatismo de seu próprio ideal: o pacifismo.

O MONTE DO MAU CONSELHO
AUTOR Amós Oz
EDITORA Companhia das Letras
TRADUÇÃO Paulo Geiger
QUANTO R$ 43 (280 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo


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