São Paulo, segunda-feira, 09 de dezembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Petrona Martínez mostra no Mercado Cultural retomada do bullerengue, ritmo típico da região caribenha do país

Cantora revitaliza tradição colombiana

ISRAEL DO VALE
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM SALVADOR

Sorriso largo, saia rodada colorida escorrendo pela cintura avantajada, lenço vermelho na cabeça. Solta pelas ruas de Salvador, a colombiana Petrona Martínez passaria despercebida, como uma versão discreta da baiana de barraquinha de acarajé. À primeira vista tímida e de pouca prosa, nem sequer esboça fora do palco o turbilhão em que se transforma sobre ele, como demonstrou na madrugada do sábado, em show no Pelourinho pela quarta edição do Mercado Cultural.
De carreira temporã, iniciada já depois dos 40 anos, Petrona é a rainha do bullerengue, ritmo enérgico, de percussão intensa e recortada, com um suspiro de melodia a cargo dos disparos de voz e de uma flauta indígena.
O bullerengue hoje vive um momento de renovação, desde que a voz de Petrona o retirou do ostracismo nos anos 80. Tem efeito similar hoje na Colômbia, entre as novas gerações do rock, ao do maracatu por aqui, reciclado via mangue beat. "Era uma música praticamente perdida", diz.
Nascida na costa norte da Colômbia caribenha, Petrona, 64, exercitou a voz aguda e rascante nos embalos do ofício camponês, ainda nos idos de infância. Só na década de 80 é que se insinuou para os palcos, primeiro como integrante do grupo Tambores de Malagana, depois como cantora e compositora de um trabalho autoral, ainda que fundado na tradição, conectado a tambores ancestrais e cantos de terreiro.
O primeiro disco veio em 1989, como desdobramento de um registro feito pela documentarista Lissete Lemoine, que a levou a ser lançada na França. A investida sobre o continente europeu gerou um novo CD gravado na Inglaterra e, este ano, uma turnê de 12 shows pela Espanha e Itália. Ao todo, hoje, já se somam seis discos -nenhum lançado no Brasil até o momento. Suas músicas cantam as coisas simples de todo dia, a vida fora do contexto urbano. "São sobre o que vejo, o que vivi quando criança", diz ela.
O aspecto algo ritualístico da conjunção de quatro tambores frenéticos é reforçado por outro dos temas de sua predileção e que remete a certas tradições indígenas: a evocação aos mortos. São os casos de músicas como "Mi Tierra Santa" e "El Parrandón", do disco mais recente, "Bonito que Canta". Atua num registro poético e celebrativo, que nada tem de mórbido. "El Parrandón", diz ela, foi feita para a cantoria que espera ter em seu enterro, em lugar do choro. Porque, afinal, um encontro com Petrona tende sempre para a festa.



Texto Anterior: Música: Poderia ter sido histórico, mas foi só correto
Próximo Texto: Comentário: Festival promove volta à raiz
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.