São Paulo, sábado, 09 de dezembro de 2006

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Cultura tenta barrar Lei do Esporte

Com medo de ser preterida em disputa por patrocínio, área artística articula emenda ao projeto que beneficia os esportes

Aprovado na Câmara, projeto que estende ao esporte renúncia fiscal que beneficia a cultura gera uma guerra de lobbies no Senado


Thiago Bernardes/Folha Imagem
O ministro da Cultura, Gilberto Gil, que questiona poder de gestão da lei pelo Ministério do Esporte


RODRIGO MATTOS
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

Aprovado na Câmara Federal, o projeto de lei de incentivos fiscais para o esporte (1367/ 03) é visto como uma ameaça por artistas e produtores culturais, que tentarão alterá-lo, o que pode impedir sua aprovação. Temem a concorrência por verba entre os setores.
Parlamentares ligados ao esporte, porém, já reagiram. Isso deu início a uma batalha em torno da legislação, que ocorre no Senado e envolve os ministérios da Cultura e do Esporte.
"É uma intranqüilidade [a existência do projeto]", afirma Ronaldo Bianchi, vice-presidente do Itaú Cultural.
O desagrado dos representantes da cultura vem do fato de que, se aprovada a nova lei, projetos esportivos e culturais passarão a disputar o mesmo "bolo" de patrocínio empresarial.
Isso ocorrerá porque a Lei Rouanet e a Lei do Esporte estariam limitadas ao mesmo teto de renúncia fiscal, até 4% do Imposto de Renda das pessoas jurídicas. Ou seja, as empresas podem deixar de investir em cultura, optando pelo esporte.
"Existe essa preocupação [em relação à nova lei]", afirma o ministro da Cultura, Gilberto Gil à Folha. Gil questiona a capacidade do ministério do Esporte de gerenciar a sua lei.

"Dificultoso"
"Esse primeiro momento da gestão da lei vai ser dificultoso para eles. Nesse sentido acho que eles deviam contar com as experiências da Lei Rouanet."
Parlamentares ligados ao esporte contra-atacam: não consideram eficiente a atuação do setor cultural na captação de incentivos.
"Quanto [dinheiro] a Cultura tem conseguido por ano? Eles não conseguem nem captar o que têm direito", disse o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), relator do projeto na Câmara. "É uma mediocridade [o lobby cultural]. Há um universo grande a ser explorado."
Em 2005, foram captados por meio da Lei Rouanet cerca de R$ 700 milhões. Houve um aumento de 23% em relação ao ano anterior. No caso do esporte, haverá um teto de R$ 200 milhões por ano, segundo parlamentares ligados ao projeto.
Até agora o lobby dos artistas não é explícito porque o setor do cinema -um dos maiores beneficiários da Lei Rouanet- está concentrado em aprovar no Senado o projeto de lei que cria o Fundo Setorial do Audiovisual. A proposta destina mais verbas ao setor.
Nos bastidores, já atuam para apresentar uma emenda derrubando um item da Lei de Incentivo ao Esporte que vincula as verbas esportivas e culturais ao mesmo teto.
Na prática, isso inviabilizaria a lei em favor dos esportistas.
"Se houver alteração, isso vai aumentar a renúncia fiscal do governo. A Receita [Federal] não aceitaria", afirmou o deputado federal Gilmar Machado (PT-MG), articulador governista do setor do esporte.
No Senado, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), comanda o lobby em prol da legislação em favor do esporte.
O vice-presidente do Itaú Cultural diz desconhecer a articulação para a apresentação da emenda, mas afirma que "cabe a discussão no Senado sobre o impacto econômico [da Lei do Esporte] na cadeia de trabalho cultural". Segundo Bianchi, "são perguntas que precisam ser colocadas".
Outros parlamentares ligados ao esporte aderem ao contra-ataque, com influência do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e do Ministério do Esporte. O COB é o maior interessado na aprovação da lei, pois as confederações filiadas e outras entidades seriam beneficiadas.

Compromisso
O Ministério do Esporte espera que o executivo mantenha o compromisso de aprovar a lei sem alterações no Senado, como fez na Câmara. Pela assessoria, a pasta informou não ter recebido pedidos de mudanças vindos da área cultura.
Até deputados da oposição já foram mobilizados em favor do esporte. Autor do projeto, o deputado Bismarck Maia (PSDB-CE) disse ter o apoio do líder de seu partido no Senado, Arthur Virgílio, "Se alterarem o projeto, vamos mudar na Câmara."
Esse lobby tem o desfalque da numerosa bancada da bola, que é composta por parlamentares conectados ao futebol e não está agindo porque não haverá benefício para os cartolas.
Clubes de futebol com esportes olímpicos tampouco se mobilizaram. O presidente do Flamengo, Márcio Braga, diz que nada fará. Ex-deputado, ele foi um dos mais atuantes no lobby pela aprovação da Timemania, loteria que favoreceu os clubes.
"O Nuzman [Carlos Arthur Nuzman, presidente do COB] que está pilotando isso. Não tenho como largar o clube agora", disse ele.
Gil acena com uma conciliação. "Esporte é cultura."


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