São Paulo, quinta-feira, 09 de dezembro de 2010

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De Adolf a Hitler

Chega ao Brasil "Hitler", estudo rigoroso e obsessivo do historiador britânico Ian Kershaw

MARCOS FLAMÍNIO PERES
DE SÃO PAULO

O homem que imortalizou o bordão "o trabalho liberta" -sinistro sobre o portão principal do campo de extermínio de Auschwitz- não gostava de trabalhar. Também se orgulhava de suas temíveis Forças Armadas, que estiveram a ponto de submeter toda a Europa, mas fugiu o quanto pôde do alistamento militar em sua juventude.
"Hitler", que consumiu dez anos de trabalho do inglês Ian Kershaw, 67, apanha essas e outras contradições que o ajudam a desmontar o mito que o próprio Führer se esforçou em construir.
Na entrevista abaixo, ele também fala da habilidade inata para lidar com as massas, as estratégias eleitorais inovadoras, o uso político do antissemitismo e a relação "anormal" com as mulheres.
Obsessivo, Kershaw não larga sua presa, sobretudo em seus anos de formação: a infância entre o pai frio que o atemorizava e a mãe que o mimava, os anos de penúria vividos em um albergue em Viena, a relação ciumenta com a sobrinha -que acabaria por se matar no apartamento do tio, em Munique- ou as manobras políticas para tornar o inexpressivo e já corrupto Partido Nazista em legenda nacional.
O resto da história é mais ou menos conhecido e formaria um capítulo tétrico do século 20.
No entanto, as mais de mil páginas desta versão "abreviada" (Kershaw fundiu aqui seus "Hubris" e "Nemesis") são muito bem escritas e boas de ler. Combinam com maestria pesquisa de fontes, fotos reveladoras e o aporte interpretativo da psicanálise.
Em que pese o personagem, um dos Anticristos do imaginário popular, "Hitler" é um belo presente de Natal.

 


Folha - O sr. diz que a elite política alemã teve várias chances para deter a ascensão de Hitler. Por que não o fez?
Ian Kershaw -
Muitas pessoas o subestimaram. À época, era menos fácil do que parece hoje supor que a elite conservadora fosse incapaz de conter Hitler [1889-1945] ou que os nazistas, uma vez no poder, veriam sua popularidade se esvair tão rápido.

O sr. o descreve como um "um ator consumado" e fala de "sua capacidade de interpretar papéis". Ele tinha uma compreensão inovadora da figura do político?
Hitler tinha uma compreensão moderna dos mecanismos de mobilização de massa e da construção da imagem política. Nenhum outro político europeu, talvez com a exceção de Mussolini [1883-1945], soube explorar tão bem a mídia de massa moderna para fins políticos.

Em que aspecto ele foi original? Apenas na retórica ou como propagandista?
As linhas de seu pensamento -o antissemitismo radical, a ênfase na pureza racial e no darwinismo social- não eram novas. Porém, o modo como as combinou para forjar uma "visão de mundo" ou uma ideologia que lhe proporcionasse um suporte consistente para sua ação política foi realmente original.


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