São Paulo, sábado, 10 de fevereiro de 2007

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Jornalista cria fábula autobiográfica

Em "Bar Doce Lar", J.R. Moehringer entrelaça memórias de sua infância nos anos 60 e 70 com dias passados em bar

ADRIANO SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA

O título em inglês, "The Tender Bar", é horrível, e em português não ficou muito melhor, "Bar Doce Lar".
A desconfiança, contudo, desaparece quando começam a ser lidas estas memórias precoces do jornalista norte-americano J.R. Moehringer, nascido no ano de 1964.
Correspondente do "Los Angeles Times" e ganhador de um Prêmio Pulitzer, o autor entrelaça aqui acontecimentos de sua vida e do Dickens, um bar em Manhasset, Long Island (Nova York), e seus principais freqüentadores desde 1972.
Ainda que o nome do livro e seu prefácio coloquem o bar em posição central, trata-se, na verdade, da clássica fábula do herói que, contra tudo e todos (um pai que o abandonou, uma família desajustada, bebida em doses cavalares, falta de dinheiro), consegue dar a volta por cima e vencer na vida, como nos informa rapidamente o último capítulo do livro.
Mas isso não importa muito, porque Moehringer sabe contar muito bem a sua história (um dos assuntos que permeia o livro, aliás, é a busca de um modo eficaz de narrar os casos do Dickens, rebatizado posteriormente com o nome de Publicans).

Diálogos recriados
Assim como não importa, como um crítico mencionou, que ele reproduza com precisão diálogos que aconteceram com todos os seus participantes absolutamente bêbados.
Faz parte do jogo autobiográfico sempre uma boa dose de imaginação (e, quem lembra, afinal de contas, de todos os detalhes de conversas ocorridas às vezes décadas antes?).
Além de construir o retrato tocante e por vezes muito divertido de dezenas de personagens, que, com três exceções, têm seus nomes verdadeiros citados no livro, merece destaque a longa passagem em que o escritor reconstrói a sua infância atribulada pelas idas e vindas com a mãe para a casa do avô ruim e, para quem se interessa por jornalismo, todo o trecho em que se transforma em estagiário do "New York Times", com a missão de buscar comida para os editores.
Sabendo-se que, hoje em dia, Moehringer se tornou um importante jornalista -atualmente no "Los Angeles Times"-, a impressão que fica das estratégias trabalhistas do principal periódico do mundo não é das melhores.
Como uma parte considerável da produção norte-americana dos últimos anos, "Bar Doce Lar" procura lidar com o 11 de Setembro, ponto escolhido pelo jornalista para encerrar sua história.
Moehringer conta o seu retorno para a região em que crescera para missas e funerais de amigos mortos na tragédia e faz um balanço dos 11 anos anteriores (a narrativa se interrompera em 1990): "Éramos todos mestres em idealizar lugares, e depois de 11 de Setembro só sobrara um lugar para ser idealizado, um lugar que nunca poderia nos desiludir. O passado".


ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP

BAR DOCE LAR - AS MEMÓRIAS DE UM MENINO ADOTADO PELO BAR DA ESQUINA    
Autor: J.R. Moehringer
Tradução: Mauro Pinheiro
Editora: Nova Fronteira
Quanto: R$ 44,90 (432 págs.)

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