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Jornalista cria fábula autobiográfica
Em "Bar Doce Lar", J.R. Moehringer entrelaça memórias de sua infância nos anos 60 e 70 com dias passados em bar
ADRIANO SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
O título em inglês, "The
Tender Bar", é horrível, e em português
não ficou muito melhor, "Bar
Doce Lar".
A desconfiança, contudo, desaparece quando começam a
ser lidas estas memórias precoces do jornalista norte-americano J.R. Moehringer, nascido
no ano de 1964.
Correspondente do "Los Angeles Times" e ganhador de um
Prêmio Pulitzer, o autor entrelaça aqui acontecimentos de
sua vida e do Dickens, um bar
em Manhasset, Long Island
(Nova York), e seus principais
freqüentadores desde 1972.
Ainda que o nome do livro e
seu prefácio coloquem o bar em
posição central, trata-se, na
verdade, da clássica fábula do
herói que, contra tudo e todos
(um pai que o abandonou, uma
família desajustada, bebida em
doses cavalares, falta de dinheiro), consegue dar a volta por cima e vencer na vida, como nos
informa rapidamente o último
capítulo do livro.
Mas isso não importa muito,
porque Moehringer sabe contar muito bem a sua história
(um dos assuntos que permeia
o livro, aliás, é a busca de um
modo eficaz de narrar os casos
do Dickens, rebatizado posteriormente com o nome de Publicans).
Diálogos recriados
Assim como não importa, como um crítico mencionou, que
ele reproduza com precisão
diálogos que aconteceram com
todos os seus participantes absolutamente bêbados.
Faz parte do jogo autobiográfico sempre uma boa dose de
imaginação (e, quem lembra,
afinal de contas, de todos os detalhes de conversas ocorridas
às vezes décadas antes?).
Além de construir o retrato
tocante e por vezes muito divertido de dezenas de personagens, que, com três exceções,
têm seus nomes verdadeiros citados no livro, merece destaque
a longa passagem em que o escritor reconstrói a sua infância
atribulada pelas idas e vindas
com a mãe para a casa do avô
ruim e, para quem se interessa
por jornalismo, todo o trecho
em que se transforma em estagiário do "New York Times",
com a missão de buscar comida
para os editores.
Sabendo-se que, hoje em dia,
Moehringer se tornou um importante jornalista -atualmente no "Los Angeles Times"-, a impressão que fica
das estratégias trabalhistas do
principal periódico do mundo
não é das melhores.
Como uma parte considerável da produção norte-americana dos últimos anos, "Bar
Doce Lar" procura lidar com o
11 de Setembro, ponto escolhido pelo jornalista para encerrar
sua história.
Moehringer conta o seu retorno para a região em que
crescera para missas e funerais
de amigos mortos na tragédia e
faz um balanço dos 11 anos anteriores (a narrativa se interrompera em 1990): "Éramos
todos mestres em idealizar lugares, e depois de 11 de Setembro só sobrara um lugar para
ser idealizado, um lugar que
nunca poderia nos desiludir. O
passado".
ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura
da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP
BAR DOCE LAR - AS MEMÓRIAS DE UM MENINO ADOTADO PELO BAR DA ESQUINA
Autor: J.R. Moehringer
Tradução: Mauro Pinheiro
Editora: Nova Fronteira
Quanto: R$ 44,90 (432 págs.)
Leia trecho
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