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LIVROS
Crítica/ "A Menina com a Lagartixa"
Bernhard Schlink faz análise trivial de um tema grave
Tragédia dos judeus transforma-se em história de detetive na novela do autor
ALCIR PÉCORA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Depois do sucesso do filme "O Leitor", baseado
num romance de
Bernhard Schlink escrito há 15
anos, toda a sua obra vem sendo lançada no mercado internacional. É o caso da novela "A
Menina com a Lagartixa", publicada junto de outras narrativas curtas no volume "Liebesfluchten", de 2000.
A novela acompanha o crescimento de um menino alemão,
desde o pós-Guerra até o final
de seus estudos na universidade, por meio de um único fio
condutor: o seu amor por um
quadro dependurado no escritório do pai, então um juiz
bem-sucedido.
Via-se nele uma menina deitada sobre um rochedo, na
praia, no qual também estava
uma lagartixa.
Certa vez, um professor do
menino pede aos alunos que
descrevam um quadro "tão
bem a ponto de conseguirmos
visualizá-lo durante a leitura".
O menino se dedica à tarefa escolhendo o seu quadro favorito
para a descrição, mas o pai o
proíbe de mostrá-lo, alegando
tratar-se de um "tesouro" a ser
resguardado da inveja alheia.
Também o fato de se tornar
motivo frequente de brigas entre os pais, quando a mãe atacava o marido com frases como
"Vai logo para a sua menina judia", deixa claro que o quadro
oculta um mistério.
É o que o rapaz pretende desvendar enquanto cursa a faculdade e tem de viver às próprias
custas após a derrocada financeira e pessoal do pai, que morre bêbado, na rua. Por conta da
semelhança com a menina, o
rapaz escolhe, sem perceber, a
sua primeira namorada, e por
causa da disputa que supõe entre elas, desinteressa-se pela viva em favor da pintada.
Também por causa do quadro, encontra a segunda namorada, uma bibliotecária que o
trata com "amável zombaria"
-a expressão se repete a cada
vez que se encontram- ao notar sua obsessão pelo quadro. É
ela que lhe dá as principais pistas sobre o autor da obra, um
pintor judeu desaparecido com
a mulher e musa durante a
Guerra.
Revelo agora só o mais previsível: o segredo tem a ver genericamente com a questão do
roubo dos bens de judeus durante a Guerra e o peso dessa
herança para as novas gerações.
Conquanto grave, a questão
não é tratada de maneira grave.
A narrativa, alimentada embora por um clima de interdito, se
resolve como um caso de mistério. A tragédia potencial se desarma numa história de detetive, cuja solução vem por uma
abdução abrupta, sem maiores
consequências.
De resto, há uma falha estrutural no livro: o mistério a que
alude o quadro nunca chega a
ser o mistério da pintura que se
encontra nele. Ela não se torna
jamais palpável para o leitor, ao
contrário do que garante a todo
instante o narrador, que o vê
ora como "janela para a beleza e
para a liberdade", ora como
"instância dominadora, à qual
tinham de ser oferecidos sacrifícios". Schlink, ele mesmo, não
fez a lição de casa pedida pelo
professor: "Quero que vocês
descrevam o quadro tão bem a
ponto de...".
ALCIR PÉCORA é professor de teoria literária na
Unicamp.
A MENINA COM A LAGARTIXA
Autor: Bernhard Schlink
Tradução: Marcelo Backes
Editora: Record
Quanto: R$ 19,90 (112 págs.)
Avaliação: regular
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