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MÚSICA/LANÇAMENTOS
"LAND (1975-2002)"
Associated Press
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A norte-americana Patti Smith durante apresentação em 2001 |
Álbum revisa carreira da sacerdotisa punk americana
Patti Smith tenta reabilitação com coletânea dupla de luxo
DA REPORTAGEM LOCAL
Em 2000 , a sacerdotisa norte-americana do punk e da new
wave Patti Smith lançou o pífio álbum "Gung Ho", o maior tiro n'água de sua longa, mas concisa carreira. Agora, aos 55 anos, ela contra-ataca e busca reabilitação com
a luxuosa coletânea dupla "Land
(1975-2002)".
Se vivesse no Brasil, Patti provavelmente estaria lançando um
acústico, ou um "MTV ao Vivo",
que seria mais simples e fácil. Como não, intromete numa seleção
de clássicos um "disco 2" feito inteiramente de faixas demo e/ou
versões ao vivo de outros clássicos, registradas em shows recentes nem sempre bem recebidos
pelas novas gerações de público.
Tais dificuldades podem se dever não só ao cansaço da fórmula
de poesia pop feminista que ela
inventou, mas às interrupções de
sua carreira entre 79 e 87 e entre
89 e 95, nos dois intervalos porque
a ex-rebelde com causa preferiu a
família à música.
Só com a morte do marido também punk, Fred "Sonic" Smith
(ex-líder dos MC5, a mais radicalmente política de todas as bandas), em 94, Patti tentou reassumir o posto perdido por conta
própria -foram três CDs desde
96, mas certa sensação de estaca
zero permanece.
Se há crise de continuidade em
sua carreira, porém, a artista responde à crise encerrando o disco 1
com uma releitura inédita de
"When Doves Cry", de Prince.
Embora pouco tenham a ver a
new wave discursiva de Patti e o
funk sensual de Prince, a conexão
parece imediata: marginalizados
do pop, uni-vos.
"When Doves Cry" vence ao associar a voz sempre ríspida de
Patti, a poesia tão tola quanto cortante de Prince, o funk heterodoxo e rebelde do pequeno príncipe
decaído, o rock ortodoxo e teimoso da profetisa exausta.
Faixa 17 entre 30, "When Doves
Cry" é o núcleo de "Land". Antes
dela, enfileiram-se algumas das
canções (ou não-canções) que
inscreveram o nome de Patti
Smith na história.
Passam "Gloria" (75, versão
punk para sucesso do Them nos
60, que abria "Horses", o abrasivo
LP de estréia da cantora), "Ain't It
Strange" (76), "Because the
Night" (78, inusitada e bem-sucedida parceria dela com o reacionário Bruce Springsteen), "Dancing Barefoot" (79)...
Até ali, música, poesia e artes
plásticas se uniam numa só coisa
no imaginário de Patti, gêmea artística do fotógrafo Robert Mapplethorpe (1946-89). Da ultrapop
(é seu maior sucesso até hoje)
"People Have the Power" (88) em
diante, a presença e a lembrança
da ausência de Fred redirecionam
(e, talvez, abalam) sua musicalidade, como se pode perceber da
faixa 10 em diante.
No CD 2, os ânimos voltam a se
exaltar. Ouvir "Redondo Beach"
(75) e "Distant Fingers" (76) em
versões demo é uma experiência
de surpresa, de reconhecer o que
havia em Patti, mas não chegou a
ser mostrado. "Piss Factory" (74),
nunca editada em LP, traz a história toda de volta ao útero, ao instante de nascimento da artista.
Aí vêm as versões ao vivo, que
facilmente podem contribuir para
a visão de Patti como oradora verborrágica, iracunda na defesa intransigente de uma fórmula "ritmo e poesia" que já nada tem a
ver com raps e tecnos atuais.
Bem, é que o tempo voa, e Patti
Smith já é um quadro (vivo) na
parede da história do pop. Influente para um sem-número de
artistas contemporâneos (de PJ
Harvey a David Lynch, que poderia embalar todo seu provocador
"Mullholland Drive" em "Patti
songs"), ela sabiamente posa para
a capa de "Land" insegura, mão
tateante numa cortina, olhos vendados. Patti Smith já não vê o futuro, e nada há de errado nisso.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Land (1975-2002)
Artista: Patti Smith
Lançamento: Arista (importado)
Quanto: R$ 96 (CD duplo), na London
Calling (tel. 0/xx/11/ 223-5300)
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