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MENINOS, NÃO CHOREM
Robert Smith, do Cure, fala sobre os planos do disco novo de "metal" da banda e dos 25 anos de carreira
"A histeria do público brasileiro foi assustadora"
COLUNISTA DA FOLHA
Leia a seguir a entrevista que
Robert Smith, do Cure, concedeu
à Folha.
(LÚCIO RIBEIRO)
Folha - Como está seu cabelo neste momento? "Armado" para cima?
Robert Smith - Sim, está. Ele
sempre está do mesmo jeito, armado para cima. Depois de anos,
ele já fica assim sozinho.
Folha - Qual é a idéia por trás deste DVD "Trilogy"? Por que esses
três discos em particular?
Smith - Há duas razões principais para esse DVD ter surgido. Já
faz nove anos que o Cure vem
mantendo essa atual formação e
nunca gravamos nada ao vivo
nem tampouco filmamos alguns
de nossos shows. O outro motivo
é que, pessoalmente, considero os
álbuns "Pornography", "Disintegration" e "Bloodflowers" interligados de certa forma. Eles são amarrados de modo bem especial
no clima das canções e na densidade das letras de uma maneira
única em todos esses anos do Cure. Se fosse para fazer uma análise
dos 25 anos da carreira da banda,
diria que esses três discos em particular são os que estão mais fortes na minha memória. E, para
que eles fiquem fortes nas memórias das pessoas, resolvi botá-los
em filme.
Folha - Depois desse lançamento
revisionista, o que se pode esperar
do Cure no futuro?
Smith - Acabamos de assinar
contrato com uma nova gravadora e entregamos a produção do
próximo disco do Cure para o
Ross Robinson, um americano famoso por produzir discos para o
Korn, Slipknot, Amen e At the
Drive-In. Sim, eu sou fã de nu-metal [risos]. Entre as razões para
trabalharmos com Ross, estão o
fato de ele ser fã de longa data do
Cure e porque achei que seria interessante um cara como ele mexer no som do Cure. Que as pessoas não se espantem se o próximo disco sair quase... nu-metal.
Folha - Após mais de 20 anos, o
que você vê quando lembra os tempos do pós-punk no final dos 70/começo dos 80, tocando com Siouxsie
& the Banshees e formando o Cure?
Smith - Eu me sinto um sujeito
bem diferente daquele Robert
Smith, apesar do cabelo igual.
Mas a essência, eu acho, continua
a mesma.
Folha - Como as canções marcantes do passado do Cure mudaram
para você com o passar dos anos?
Smith - Hoje me sinto menos ligado às canções do começo da
minha carreira. Parece que antes
do "Disintegration" (89) eu vivi
uma outra vida. Talvez porque até
esse disco eu era muito jovem.
Quando ouço as músicas dos discos anteriores, com exceção um
pouco das do "Pornography"
(82), quase não entendo sobre o
que cantava.
Folha - Você ainda tem fascinação pela temática gótica, da melancolia, da escuridão? Acha que isso ainda faz sentido no pop?
Smith - Não acho que o Cure alguma vez chegou a prestar atenção na cultura pop. Nós criamos
nosso próprio mundo. Às vezes
você cria uma música em um dia
ensolarado, mas isso não quer dizer que, por dentro, você não sinta que esteja chovendo sem parar.
O que o Cure fez de melhor em todos esses anos foi tocar músicas
emocionais com uma forte carga
atmosférica, pendendo para o
melancólico, que é como eu sempre me senti mesmo nos mais ensolarados dos dias. Ainda hoje me
pego gostando mais de músicas
do tipo que as pessoas costumam
consideram "dark". Eu não ouço
Strauss.
Folha - Você gosta da música pop
produzida hoje na Inglaterra?
Smith - Gosto de algumas coisas.
Tem sempre pessoas fazendo músicas interessantes. Mas o pop do
Reino Unido hoje está bastante
diversificado, diluído. Faz tempo
que não aparece por aqui algo
com cara de movimento. Há pessoas que tentam fabricar uma tendência, um movimento, como fizeram com o britpop no passado.
Mas existe hoje muitos estilos diferentes dentro do que é chamado
aqui de música pop. Aí fica difícil
amarrar isso em um pacote para
vender.
Folha - Você conhece uma banda
canadense chamada Hot Hot Heat,
que está fazendo certo sucesso em
Londres agora? O vocalista do HHH
canta muito parecido com o jeito
que você cantava nos anos 80, não
acha?
Smith - Eu conheço a banda. É
realmente parecido. Não sei o que
acontece, mas há agora um número grande de grupos que mencionam o Cure de alguma forma,
seja no jeito de cantar, seja em inspiração. Eu me sinto lisonjeado.
Recentemente conversei com
aquela menina do grupo americano Yeah Yeah Yeahs, a Karen O., e
ela disse que o Cure inspirava
muito a banda dela. Sinto-me
honrado, porque a banda dela é
muito boa.
Folha - O que você lembra dos
dois shows que o Cure fez no Brasil,
um em 1987 e outro em 1996?
Smith - Quando tocamos aí em
1987 foi uma histeria para a qual
eu não estava preparado, por
mais que nossas músicas fizessem
sucesso. Diria que foi assustador
até. Não me lembro direito dos
dois shows, mas recordo que a
atenção criada em torno da presença do Cure no Brasil, nas duas
vezes, foi muito intensa. Eu me
senti bem esquisito por causa disso. Satisfeito por um lado. Mas me
perguntando por que pessoas de
um país tão alegre gostavam tanto
de músicas melancólicas e de vestir preto como um cara como eu.
Estava marcado para irmos ao
Brasil em 2000 com a turnê do
"Bloodflowers", mas acabou não
dando certo. Mas nós iremos tocar o disco novo na América do
Sul no ano que vem, isso já está
planejado.
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