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DVDS
Seriado de TV dos anos 60 retorna em caixa com quatro discos, enquanto Nicole Kidman assume o papel em longa-metragem
Feitiços de "A Feiticeira" sobrevivem à modernidade
CHRIS NORRIS
DO "NEW YORK TIMES"
A série cômica "A Feiticeira", famosa desde os anos 60, enfim chega à tela grande (no Brasil, estréia
em 30/9) transformada pela roteirista e diretora Nora Ephron em
uma carinhosa homenagem metalingüística ao passado mais doce e inocente da televisão, estrelada por Nicole Kidman. Quase ao
mesmo tempo, o programa clássico terá sua primeira temporada
lançada no Brasil em DVD.
Quem, em nossa era de "Desperate Housewives" (Sony), não
sente nostalgia da era dourada da
TV? Com "Jeannie É um Gênio",
"A Feiticeira" foi pioneira na estranha variedade de seriados cômicos estrelados por donas-de-casa com poderes sobrenaturais.
Hoje, esses programas se tornaram material para a crítica feminista. Estudiosos há muito celebram a combativa bruxa Samantha (Elizabeth Montgomery, na
série) como um modelo esperançoso para uma sociedade que mudava: inteligente, atraente, dedicada e literalmente cheia de poder. Os esforços dela para equilibrar as exigência da vida de dona-de-casa com o ego frágil de seu
marido e seus poderes sobrenaturais traçam uma trajetória para as
mulheres que tinham de balancear os desafios domésticos, sentimentais e as ambições profissionais que começavam a despertar.
"Trata-se de expressão da inquietação e do descontentamento
que antecipam o feminismo", diz
Molly Haskell, autora de "From
Reverence to Rape: The Treatment of Women in the Movies"
[da reverência ao estupro: o tratamento das mulheres nos filmes].
"A Feiticeira" tem um elenco de
demônios e publicitários falastrões, sempre bebendo coquetéis.
O seriado dava vazão a algumas
das ansiedades mais sérias da era;
os feitiços de Samantha oferecem
correções benignas e diplomáticas para as dificuldades que afligem um casal de classe média,
branco, de um marido se esforçando profissionalmente e de
uma sogra que desaprova a filha
que casou com alguém inferior.
O seriado foi ao ar entre 1964 e
1972, período que viu a criação da
Organização Nacional de Mulheres e o debate sobre a Emenda da
Igualdade de Direitos. Mas em
1965, quando "A Feiticeira" encontrava sua audiência, estreou
"Jeannie É um Gênio", para irritação do nascente movimento feminista e intrigar meninos de olhos
arregalados, como um dos mais
retrógrados, reprováveis e sedutores programas da TV.
Situada no ambiente dos pilotos
de provas conquistadores, o programa atendia às fantasias de moleques: uma menina-mulher
(Barbara Eden) que se veste sumariamente, chama o namorado
de "mestre" e é reduzida ao tamanho de uma boneca, guardada em
uma garrafa de formato fálico.
Samantha e Jeannie tinham algo
em comum: estavam sob o domínio de espécimes deficientes masculinos. A implicação era clara:
até mesmo a mais poderosa das
mulheres fica em segundo plano,
ainda que o homem seja inferior.
O domínio dele sobre a casa se baseia no privilégio patriarcal.
"O importante era que, ao final,
Samantha estivesse lá, em seu vestidinho de cintura fina, segurando
um martíni para o marido", diz
Susan J. Douglas, autora de
"Where the Girls Are: Growing
Up Female with the Mass Media"
(onde as garotas estão: crescendo
como menina na companhia da
mídia de massa) e professora na
Universidade de Michigan. "Tanto Jeannie quanto Samantha tinham poderes, mas dependiam
do amor dos homens patetas."
Duas décadas depois, ainda oferecem modelos para a visão conflituosa que a TV traz sobre a mulher, já que as produções com
mulheres de poderes sobrenaturais, hoje, são derivações de "A
Feiticeira" ou "Jeannie" -da heroína de "Buffy, a Caça-Vampiros" (Fox) às gostosas dos programas que falam do poder feminino, como "Charmed" (Sony).
Tradução de Paulo Migliacci
A Feiticeira (1ª temporada)
Direção: William Asher
Lançamento: Columbia
Quanto: R$ 106,90, em média (box de
DVD com quatro discos; lançamento
previsto para agosto)
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