São Paulo, quarta, 10 de setembro de 1997.



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ARTES PLÁSTICAS
Michelângelo convenceu Deus e todo mundo

da Reportagem Local

O mestre renascentista Michelangelo di Ludovico Buonarroti Simoni, o Michelângelo, foi um dos casos raros de unanimidade no meio artístico. E isso ainda em vida. Seu "Davi", por exemplo, foi admirado por contemporâneos ilustres, como Leonardo da Vinci, Botticelli, Perugino e Filippino Lippi.
Foi definido como um artista enviado por Deus pelo historiador e artista Giorgio Vasari (1511-1574). "E o Senhor do Paraíso decidiu enviar à Terra um artista que possuísse aptidão para todas as artes, cuja obra servisse para nos ensinar como atingir a perfeição", escreveu Vasari.
Mesmo a Igreja Católica, com todos os seus dogmas, aceitava seus caprichos e o erotismo latente de seus trabalhos. Os nus de "Juízo Final", por exemplo, escandalizaram o papado, que só mandou cobri-los depois da morte do mestre. O encarregado foi Daniel de Volterra, seu aluno e admirador.
O nível de adoração do papado era tamanho que o papa Júlio 2º, o primeiro dos sete papas com quem trabalhou, dizia que doaria seu sangue e alguns anos de sua vida apenas para prolongar a de Michelângelo.
Foi Júlio 2º que, em 1505, lhe encomendou uma de suas empresas mais difíceis: o próprio túmulo do papa. A obra, que teria mais de 30 estátuas, foi finalizada apenas em 1547 e em versão reduzida, já que Michelângelo foi interrompido por várias outras encomendas papais.
Nem o apoio dado à República de Florença, em sua luta contra o papado, lhe indispôs com a igreja, que, passada a guerra, volta a exigir seus trabalhos.
Michelângelo sempre se considerou um escultor, mesmo quando empenhado nos trabalhos mais importantes de sua vida, como os afrescos da Capela Sistina, que aceitou a contragosto. "Junto com o leite de minha ama, engoli o martelo e o formão que uso para fazer minhas estátuas", disse.
Apenas com a escultura Michelângelo conseguiria recuperar o ideal de beleza da Grécia antiga, baseado no equilíbrio das formas e na reunião de figuras laicas e sacras.
Mesmo sendo um dos artífices do Renascimento, é possível pressentir em Michelângelo também o fim do movimento. O artista negou as conquistas da perspectiva, rompeu com o ilusionismo e com a harmonia renascentista. A veemência das formas anatômicas humanas anunciavam o barroco, como no desenho desta página, preparatório para a cena "Expulsão do Paraíso", nos afrescos da Capela Sistina.
"A mostra nasce a partir de um projeto de divulgação da Casa Buonarroti no mundo, que está sediada em um local onde viveu Michelângelo em Florença. É um convite para que pessoas muito longe de nós conheçam um pouco de nossa realidade museológica", disse Pina Ragionieri, diretora da Casa Buonarroti.
A mostra será enriquecida com uma exposição de arte italiana do acervo do Masp, do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) e de outras coleções brasileiras, curada pelo professor Luiz Marques.
"Procurei não repetir os mesmos empréstimos feitos para a mostra de arte italiana do final do ano passado. Também tentei, mesmo que de maneira relativamente tênue, fazer com que a mostra tivesse relações com Michelângelo, privilegiando, por exemplo, o nu", disse. (CELSO FIORAVANTE)


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