São Paulo, sexta-feira, 10 de setembro de 2004

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SHOW

Compositor apresenta "Clara Crocodilo", de 1980

Arrigo Barnabé e sua vanguarda paulista engrenam marcha à ré

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

De hoje a domingo, a vanguarda paulista toma o caminho da retaguarda e revive um dos seus momentos de maior sucesso e inspiração. O compositor Arrigo Barnabé, 52, arregimenta a velha parceria com a banda Sabor de Veneno para mostrar, no Sesc Vila Mariana, sua mais bem-sucedida criação: o disco "Clara Crocodilo", que data de 1980.
O disco foi elaborado como uma sucessão de narrativas, sendo a principal delas a de um office-boy que, após passar por uma desilusão amorosa, vira cobaia de um experimento que o transforma no monstro mutante do título. A mistura de referências do universo pop, como quadrinhos e estereótipos urbanos, tendências da música erudita do século 20 e performances impagáveis fizeram das apresentações de "Clara Crocodilo" um "must" da São Paulo dos anos 80, sucesso em rádio e influência de bandas como a Blitz.
De lá para cá, o criador seguiu outros rumos, mas voltou a tropeçar na criatura por algumas vezes. A última delas foi a pedido do próprio Sesc, pelas comemorações dos 450 anos de São Paulo, quando o espetáculo de hoje foi concebido, e a Sabor de Veneno, reagrupada. A montagem foi executada no início do ano nos Sesc Pompéia e Ipiranga, e a entidade firmou contrato de exclusividade sobre ela por seis meses.
Curiosamente, Barnabé havia se debruçado em 1999 numa versão amadurecida da obra, já que considerava que a original tinha algumas lacunas. "Fiz uma "Clara" mais sinfônica, pois eu sentia falta de escrever mais partes", disse o compositor, que tem forte formação erudita. A versão que será exibida a partir de hoje, porém, não traz as partes recentes, sendo fiel aos arranjos de 1980. "O que já deu bastante trabalho nos ensaios, paramos de tocar juntos em 81", afirma Barnabé. Para ele, a primeira versão tem mais "tesão".
"É uma viagem no tempo. ['Clara Crocodilo'] É um negócio que pega no palco, pois representa o começo da carreira de nós todos", diz Barnabé sobre a retomada da obra por uma banda quase idêntica à original. Apenas Bozo Barretti (teclados, ex-Capital Inicial) e Gilson Gibson (guitarrista) não estarão na banda, além de Tavinho Fialho (baixo) e Rogério Benatti (percussão), já mortos.
No palco, os 13 músicos (Barnabé incluso) vestem o uniforme de presidiário que já era marca da primeira montagem. Entre as participações de destaque, vê-se a cantora Tetê Espíndola ("Escrito nas Estrelas"), que já tinha uma intervenção no original.
Barnabé reconhece que algumas piadas perderam um pouco de seu subtexto, que fazia referências à época da ditadura, mas não crê que isso fará falta ao espectador das novas gerações.
Apesar de volta e meia reencontrar seu trabalho de 24 anos atrás, o compositor, nascido em Londrina, está longe e ser um saudosista. "Tenho composto peças para piano solo e quartetos de câmara numa formação similar a Oliver Messiaen, com clarone, violino, violoncelo e piano", afirma. Ainda assim, há coisas para vir no túnel do tempo: Barnabé promete para este semestre o relançamento, em CD, de outra de suas obras, "Cidade Oculta", pelo seu selo, Tanx God.
No ano passado, entregou ao Centro Cultural Banco do Brasil uma "Missa" com texto em latim para acompanhar a mostra dedicada ao artista plástico Arthur Bispo do Rosário. Atualmente está trabalhando sobre outra "Missa", dedicada ao cantor e compositor Itamar Assumpção.
"Se Itamar estivesse vivo, certamente estaríamos trabalhando juntos. Faltou a ele um reconhecimento maior. Foi um desperdício", afirma Barnabé.


ARRIGO BARNABÉ E BANDA SABOR DE VENENO. Onde: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, Vila Mariana, São Paulo, 0/ xx/11/5080-3000). Quando: hoje e amanhã, às 21h; dom., às 18h. Quanto: de R$ 5 a R$ 15.


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