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TEATRO
"As Turca", de Andréa Bassitt, mostra três irmãs que brigam e demonstram afeto em meio às dificuldades financeiras
Peça aborda conflitos da tradição árabe
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
As três irmãs estão na cozinha.
Fazem parte de uma família de ascendência árabe e cristã. Preparam a festa de 80 anos do tio Nagib. Em meio a tâmaras, damascos, tahine, coalhada fresca, homus, pão e as esfihas que assam,
elas temperam o espetáculo com
os dissabores da vida, sobretudo
aqueles que passam pelo bolso.
Nura, a mais velha, Dulce e a caçula Vitória estão na pindaíba. As
dívidas podem levar à perda da
loja de tecidos. Essa curva de ascensão e queda da família, que
passa pelas gerações das personagens, é a base do conflito do espetáculo "As Turca", misto de comédia e drama que estréia hoje no
teatro do Centro Cultural Banco
do Brasil, em São Paulo.
O título da peça de Andréa Bassitt alude ao hábito da gente simples do interior, como as personagens, em flexionar o artigo, mas
deixar o substantivo no singular.
Como pano de fundo, há o contexto da imigração dos árabes para o Brasil no início do século 20.
Eram, em geral, sírios e libaneses
que chegavam com passaportes
"turcos", como eram apelidados,
segundo a autora. A maioria, expulsa por questões político-religiosas na Síria.
Mas o que salta em primeiro
plano é a ruidosa relação das irmãs Nuria (interpretada por
Cláudia Mello), Dulce (Juçara
Morais) e Vitória (Bassitt). Elas
batem boca, a caçula e a mais velha chegam a se estapear, mas tudo é sublimado pelo afeto.
Pelo menos esta foi a percepção
de três espectadores que assistiram a um ensaio na semana passada, a convite da Folha.
"É uma peça sobre o amor", diz
o jornalista Mohamed Yunes Abdul Ghani Abdul Ghani, 50, tesoureiro da Fearab (Federação de Entidades Árabe-Brasileiras do Estado de São Paulo).
Ele chorou na cena em que as irmãs põem de lado os problemas
financeiros e se irmanam de fato.
"O papel da mulher é o segredo: se
ela educa o homem para o bem,
ele será um bom homem. Daí o
valor que o árabe dá à família e à
mulher, a ponto de às vezes sufocar", diz Abdul Ghani, em conversa com o elenco e a diretora do espetáculo, Regina Galdino.
"A autora foi muito feliz em retratar o lado emotivo do árabe,
um povo que briga muito entre si,
mas tem laços fortes. Quando um
irmão precisa, ele dá a alma", diz
Eduardo Elias, 62, presidente da
Fearab.
Para o escritor Mustafa Yazbek,
53, "As Turca" transcende as
preocupações com a herança cultural sírio-libanesa que se propõe
a transmitir.
"É como se a humanidade das
personagens superasse a configuração antropológica arábica veiculada por algumas informações
específicas", diz o autor de "Palestinos - Em Busca da Pátria"
(1995). De acordo com Yazbek, as
irmãs poderiam ser oriundas da
cultura do Oriente Médio, mas
também da Espanha, da Itália, de
Portugal ou do Extremo Oriente,
e a "simplicidade comovedora"
seria a mesma.
Bassitt, 39, concorda com essas
leituras. A peça recorta universos
da família, da política (um atentado numa universidade norte-americana em Beirute deixará estilhaços também entre as irmãs),
da palavra com extrato poético e,
claro, da comida como símbolo
agregador.
Nascida em São José do Rio Preto, bisneta de libaneses, Bassitt leva para a peça parte de sua própria família, ainda que o recorte
não seja autobiográfico.
As Turca
Quando: estréia hoje (convidados); qui.
e sex., às 19h30. Até 16/ 12
Onde: CCBB-SP - teatro (r. Álvares
Penteado, 112, centro, tel. 3113-3651)
Quanto: R$ 15
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