São Paulo, terça, 10 de novembro de 1998

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POEMAS

"1"
Retrato do artista
quando coisa: borboletas
Já trocam as árvores
por mim. Insetos
me desempenham.
Já posso amar as moscas
como a mim mesmo.
Os silêncios me praticam.
De tarde um dom
de latas velhas se atraca
em meu olho
Mas eu tenho
predomínio por lírios.
Plantas desejam a minha
boca para crescer
por de cima. Sou livre
para o desfrute das aves.
Dou meiguice
aos urubus.
Sapos desejam ser-me.
Quero cristianizar as águas. Já enxergo
o cheiro do sol.

² "11"
A maior riqueza
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.
Palavras que me aceitam
como sou
-eu não aceito.
Não aguento ser apenas
um sujeito que abre
portas, que puxa
válvulas, que olha o
relógio, que compra pão
às 6 da tarde, que vai
lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai. Mas eu
preciso ser Outros.
Eu penso
renovar o homem
usando borboletas.
²

Poemas de "Retrato do Artista Quando Coisa", de Manoel de Barros.





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